Somos diferentes como a água e o vinho.
Tu és o tatu e eu o passarinho.
Tu és o escravo de perdido sono,
Eu, livre cão, que não aceita dono.
Tu és a corda que aperta e sufoca,
Eu, liberdade que despreza a toca.
Tu és triste sábio, funda cicatriz,
Eu, quem não sabe, mas faz-se feliz.
Tu és no escuro algo que eu invento.
Não duras muito: eu não te alimento.
Tu és do chão a terra seca e fria,
Eu sou da Terra toda a melodia.
Tu és a fala de uma vida louca,
Eu sou o lenço que te tapa a boca.
Enquanto existo, és uma ilusão.
És oco peito e eu sou coração.
Tu és silêncio sobre os esquecidos,
Eu sou palavra em todos os ouvidos.
Tu és tristeza, só por opção.
Sou alegria, só por vocação.
Fazes do caminho escuro véu,
Eu tenho por caminho o azul do céu.
A direção que tomas é só tua,
A minha direção é aberta rua.
Para que tentes largar a tristeza,
De vez em quando aceno-te a beleza.
Tu és fatalidade, eu sou destino.
Tu não me segues, só por desatino.
Tu és a ilusão de bem traçadas linhas,
Eu sou verdade até nas entrelinhas.
Tu és o insensato e bárbaro arremesso,
Eu sou o vivo e eterno recomeço!