AMIGO
Jota Há
Há pessoas que atingem o que poderíamos chamar de: auge da implicância. No passado tive um amigo, eu tenho certeza, atingiu esse estado. Eu disse tive, esse amigo eu sei que está vivo que, ainda não morreu, mas como faz muito tempo que eu não o vejo e, sei que amigo se faz em cada novo encontro. Nós mudamos, as pessoas mudam, portanto eu não sei se ainda possuo esse amigo ou se conseguiria fazê-lo em novo encontro.
Não sei também se ele continua só implicante ou se já conseguiu ultrapassar outras barreiras.
Esse amigo foi por muito tempo meu companheiro de noitadas. Tomávamos na época só cerveja, uma única marca. Meu amigo nunca aceitou na mesa cerveja sem o rótulo e um detalhe, a tampinha havia que permanecer na boca da garrafa até que ele pusesse os óculos para ler à procedência da cerveja. Ele só tomava cerveja produzida e engarrafada em uma única cidade do Brasil. Varias vezes, por brincadeira o testamos, trocando o líquido e ele o recusou só pelo cheiro, mesmo depois de haver ingerido quatro ou cinco cervejas.
Só fumava uma determinada marca de cigarro, se preciso fosse, caminhava a pé dois quilômetros para adquiri-lo.
Uma noite estávamos em uma boate, lá pelas três da madruga ele resolveu tomar leite com groselha, não sei quanto pagou, mas não foi o garçom, foi o gerente da casa quem o serviu.
E outras implicâncias mais, por exemplo: duplas caipiras – moda de viola, ele detestava. Dizia não entender o porquê daquele gênero, além do mais as letras eram só desgraças. Implicava também: por que dupla? O que dizia fazer a primeira ele o chamava de incompetente porque precisava da ajuda do companheiro que fazia a segunda. O que dizia fazer a segunda ele o chamava de incompetente porque não era capaz de fazer à primeira. No fundo ele odiava todas as duplas, porque dizia ele: era a junção de dois incompetentes.
Tem mais, o dia que eu acho que ele atingiu os píncaros da implicância foi quando estávamos almoçando em um restaurante daquela pequena cidade, o restaurante cheio e, em dado momento ele saiu com essa: Assim como existem lugares apropriados – privada – para que o ser humano possa defecar, deveria também existir lugares apropriados – privado – para o ser humano fazer suas refeições.
Admirado, sem entender, perguntei por quê? E, ele me apontou um cidadão há umas duas ou três mesas da nossa, almoçando, segurando os talheres como se fossem suas ferramentas de trabalho: pá e picareta. Mastigava e discutia futebol ao mesmo tempo, com a boca cheia é óbvio. Eu respondi: deixa pra lá. E continuei almoçando.
“É difícil entender: por que o ser humano se esconde para usar o banheiro e, sempre almoçam e jantam juntos?”
A. Q.