Eu Preciso de Vocês! Raquel Caminha Matos. Foram quarenta anos de diária convivência, me apaixonei por você ainda adolescente, minha família dizia que não tinha consciência, aquela companhia era perigosa e indecente. Muitas vezes fui repreendida pelo meu tio, o maior castigo era impedir que eu saísse, perdia bailes, festas, chorava horas a fio, mas jamais escutava, achava uma tolice. No Liceu nosso encontro era às escondidas, passávamos alguns momentos bem relaxantes, mas na angústia eu percebia as horas perdidas, com medo de nos proibirem aqueles instantes. Foram tantas as reprimendas, sem jamais desistir, o envolvimento era maior a cada dia que passava, a família percebeu que não adiantava mais insistir, meu tio, porém, era rigoroso e sempre o respeitava. Criaram-se entre nós laços quase indestrutíveis, estávamos sempre juntos em todos os momentos, separarmo-nos eram pensamentos impossíveis, causar-nos-ia, tristezas, desesperanças, tormentos. Casei-me, tive duas filhas, que diziam o mesmo, mamãe ele não lhe faz bem, está lhe destruindo, a senhora está sem disposição, vagando a esmo, está perdendo a alegria, ele está lhe consumindo. Aproveite essa jovialidade que ainda lhe resta, nós precisaremos de você ainda por longos anos, a senhora está percebendo que ele lhe detesta, do contrário não provocaria tantos desenganos. Minha alegria de viver era tamanha e tão forte, que eu tinha certeza qualquer obstáculo venceria, minhas convicções eram o meu grande aporte, e pensando, assim, sentia um enorme calmaria. Um dia, eu me preparava para ir ao aeroporto, para esperar uma sobrinha que vinha de Brasília, ao me preparar para sair, senti um desconforto, o peito ficou apertado e eu pensei na família. Foi um mal-estar tão amargo que me assustei, tomei um tranqüilizante e me senti mais calma, quando retornei do aeroporto eu me sentei, comecei a suar frio e percebi ir-se minha alma. Aflita eu expliquei que minha vista embaçava, que estava perdendo as forças, pedi socorro, quando cheguei ao hospital eu não mais andava, numa maca eu dizia me ajude senão eu morro. O eletrocardiograma indicou um enfarto agudo, eu não tinha mais que cinco minutos de vida, às pressas um marca passo resolveu quase tudo, o coração passou a ser monitorado, não vi nada. Tive duas paradas cardíacas e fui reanimada, me levaram para a sala de cirurgia, com pressa, quando acordei no quarto já era uma safenada, com quatro pontes de safena, me safei dessa. Hoje tenho todo o meu sistema circulatório, comprometido e tomo vários medicamentos, tenho que levar um vida calma, é obrigatório, sempre vivo em sobressaltos e tormentos. Eu dizia para minhas filhas, quando eu morrer, coloque em meu caixão uma carteira de cigarro, um isqueiro, que fumar no céu, vocês vão ver, depois disto numa profunda tristeza me esbarro. Delimitei meus espaços, controlo as emoções, sinto uma tristeza imensa de assim me encontrar, o cigarro, de fato, destrói tudo, sobretudo corações, amigos e amigas, eu vos suplico, deixem de fumar. Eu preciso conviver com vocês por muitos anos, essa convivência diária tem sido minha salvação, cada dia acordo feliz, com amor, sem desenganos, vamos percorrer essa estrada, não me deixem não.
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