CARTãO DE VISITAS
Cleide Canton
Fazia frio lá fora...
O peito repleto de saudade
aguardava a tua volta.
Um misto de medo e de esperança
parecia emoldurar a lembrança
de tantos momentos felizes
perdidos em cinzentos matizes.
Afinal, o que fazia eu
num mundo não mais meu?
No ar um perfume de novidade,
nos cristais restos de festas,
nas almofadas um toque de vaidade,
no som, um CD de serestas.
Seria um caso a mais
entre tantos outros iguais?
Meus olhos detinham-se nos detalhes.
Novas cores nas paredes
um vaso grande na sacada,
duas redes...
Um novo quadro, uma escultura,
os livros sempre jogados
o relógio cheirando a Antigüidade,
cinzeiros por todos os lados.
O tempo andando ligeiro,
o medo por companheiro,
breve tremor, vacilação...
Novamente a contramão.
Talvez fosse melhor nada saber.
Pior cego o que não quer ver?
Deixei o cenário vazio
a não ser pelo cartão de visitas
com duas frases restritas
colocado sobre a mesa:
"Estive aqui.
Antes viver na dúvida
do que morrer na certeza."