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histria: O RIO ZAMBEZE - LUPÁTA
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De: cafe-zambeze  (Mensaje original) Enviado: 09/10/2008 23:01

O RIO ZAMBEZE

Entre Sena e Tete, um longo percurso fluvial, o Zambeze, procurando escolher caminho, envereda por terrenos difíceis e muda, pouco a pouco, a sua feição calma e espraiada — até se meter na famosa gar­ganta da Lupata.

E esta é, de certo ponto de vista, a mais bela e apaixonante passagem do percurso do grande rio até Tete — uma espécie de apoteose, pois, desde Sena, o rio embe­leza-se, à custa da animação dos territórios que atravessa, e ganha todo o esplendor cenográficoo que, pouco a pouco se prometia, no estreito da Lupata.

Depois de uma estrada líquida em que nadam algumas ilhas, alcançam-se para­gens onde imperaram Inhaúdes e Bongas (margem esquerda) e se celebrizou o Manuel António (margem direita), e que recordam o período nocturno da História de Moçambique. Compreende-se quanto a natureza do terreno favoreceu estes rebel­des — terreno outrora belicoso, propício a ciladas, naturalmente defendido, e agora simplesmente belo na sua selvagem e movi­mentada animação.

Entretanto as margens apertam cada vez mais o curso da テ。gua. A certa altura nテ」o se compreende muito bem onde enconュtrarテ。 saテュda tanta テ。gua que jテ。 corre apresュsada e resmungona. Parece que uma grande muralha se lhe op천e. Por fim surge o imponente pórtico da garganta: na margem direita, talhada em penedias abruptas, que sobem desde o nível das águas até alturas sinistras, abre-se uma fenda que dá passagem a um afluente apressado. Os montes marginais revestem-se de densos matagais, ora fartos como tapetes felpudos, ora ressequidos como lenha, conforme a estação. À beira-rio o debrum verde é eterno e compacto. Na mar­gem esquerda adormece, indiferente às ondas do terreno e antecedendo a garganta, uma planura agradável (Bandase e Maiembe) onde outrora se juntavam, como em parada, os homens de armas dos Bongas. O pórtico é constituído por altos e magní­ficos penedos — maciços, brutos, marcados pelo Tempo, que reduzem a largura da passagem a uns escassos cincoenta metros. Olha-se para a entrada imponente e pensa-se imediatamente nos trabalhos que sofreram os antigos transitários do Zambeze, nas suas embarcações frágeis, movidas à força de braços. Parece uma brecha violentamente aberta no terreno penhascoso pela força indómita do rio.

Nas fendas das rochas, como elementos decorativos ajustados, escolhidos a dizer, pegaram e crescem euforbias carnudas e disformes, figueiras brancas de recorte braュvio e arbustos selvagens. Aonde puderam vingaram imbondeiros.

As águas correm apressadas e grazinentas, com rumor fabril.

As variantes de luz durante as horas do dia e da noite dão ao quadro aspectos tam­bém muito variados. Pode parecer, em noi­tes de tormenta vergastadas por faíscas, a porta do Inferno, é de um romantismo, ao mesmo tempo severo e doce, em noites de luar, é simplesmente imponente na sua grandiosidade selvagem às horas cruas do meio dia.

Transposto o portal, o estreito corredor faz esquecer por completo o Zambeze espraiado que se vence desde o Chinde. Dir-se-ia que o rio luta ainda pela conquista da brecha que abriu. Logo a pou­cas centenas de metros, vêem-se dois mon­tes — o Muendonangoma na margem di­reita e o Kassisi, menos encorpado, na mar­gem esquerda — que nos dão a impressão de serem duas partes do mesmo cabeço que o rio cortou na sua passagem.

Escondiam-se aqui, para surpreendeュrem e assaltarem as lanchas de comテゥrcio, os salteadores dos Bongas.

Dos perigos da navegaテァテ」o nestas paraュgens, outrora, quando todas as relaテァテオes comerciais entre Tete e o litoral se pratiュcavam pela via do Zambeze, avalia-se bem. Muitas vidas e fazenda por aqui se perdeュram, alテゥm das que a pirataria ceifou. Ainda hoje se ouvem nomes de certos passos difテュュceis com que os indテュgenas desse tempo os assinalaram e que nテ」o se tentavam sem primeiro subornar os espテュritos com presenュtes de tabaco, carne, farinha, etc. Kapimem e Chifura ficaram nas lembranテァas do gentio como passagens de grande perigo.

As grandes paredes cedem lugar, de longe em longe, a vales frescos, com desenho e cores de encantamento - verdadeiros refú­gios das coisas doces e belas — mas o cená­rio temeroso de rochas e flora áspera, logo se recompõe, irando o rio e mantendo a fisio­nomia típica do lugar. No auge da estação seca quando as queimadas esbrazeiam os matos e se acendem nestas paragens, o espectáculo sobe até ao fantástico — e só quem alguma vez o presenciou, em noites densamente escuras da Lua Nova, o pode imaginar.

A seguir à passagem arriscada de Chifura, que atrás já referimos, há um vale, onde por volta da última década do século passado um missionário húngaro em viagem para Tete, surpreendeu. Mas deixemos falar o padre, reproduzindo as palavras do seu diário:

ツォLogo que passamos o perigoso lugar denominado Chifura vimos num vale largo um objecto estranho. Um grande mutondo tinha suspenso num dos seus ramos um boneco fantテ。stico de um metro de altura. A figura branca com a boca e os olhos pinュtados a preto, e bem assim a circunstテ「ncia de ter sido enfiado pelo pescoテァo e num sテュtio que dava muito nas vistas, mostrava claュramente qual a sorte que os indテュgenas deseュjavam a cada branco. Dada a conduta dos marinheiros convenci-me de que isto nテ」o significava outra coisa. Faziam de conta que nテ」o viam o boneco e deitavam-me olhares furtivos. Compreende-se muito bem esta inocente demonstraテァテ」o no velho paテュs dos membros da famテュlia revoltada no terriュtテウrio dos muzungos pretos, que s찾o os maiores inimigos dos brancos».

Nテ」o pode dizer-se que os pretos da Lupata, em 1890, nテ」o fossem muito semelhanュtes a certos brancos da Europa, do sテゥc. XX.

Passado o estreito ou garganta da Lupata, o Zambeze, à medida que o terreno vai cedendo, torna a espraiar-se, a descer com dengosos vagares no seu leito amplo, por entre os seus arquipélagos de areia e caniço.



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De: cafe-zambeze Enviado: 09/10/2008 23:35
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