Mais de três dezenas de autores estão reunidos numa antologia do conto moçambicano, que dá pelo nome “As Mãos dos Pretos”. Organizado pelo também escritor Nelson Saúte, este livro foi dado a conhecer ao público em Fevereiro último, pelas Publicações Dom Quixote. A ficção moçambicana tem atravessado diferentes períodos. Uns mais ricos e interessantes, outros que acusam um menor entusiasmo literário. Contudo, existiu na segunda metade do século XX um florescer da ficção narrativa em Moçambique, de onde Nelson Saúte recuperou alguns nomes de escritores que trouxeram à literatura do país uma pluralidade de posturas estilísticas e de novas linguagens, confirmando assim o renascer de uma ação criativa substancialmente melhorada.
Sem qualquer critério especial de seleção, a não ser a qualidade dos textos, Nelson Saúte reuniu em livro um conjunto de mais de três dezenas de autores que traduzem nas suas palavras “o devir moçambicano, de forma excepcionalmente esplendorosa”.
Nesta viagem à ficção moçambicana, o organizador d’ “As Mãos dos Pretos” ressalva da década de 40 dois dos poetas maiores de Moçambique: José Craveirinha e Rui Knopfli, responsáveis “pela excelente tradição poética que as gerações posteriores beneficiaram e beneficiam. Craveirinha pela força telúrica dos seus versos (…) e Knopfli pelo ecletismo da sua poesia, pela modernidade e pelo complexo entendimento do destino de um país e dos seus homens (…)”, esclarece Nelson Saúte no prefácio.
Num contexto anterior à independência, Nelson resgata como manifestações únicas da prosa de ficção moçambicana nomes como João Dias (Godido e Outros Contos, em 1952), Luís Bernardo Honwana (Nós Matamos o Cão Tinhoso, em 1964), Orlando Mendes (Portagem, em 1966) e Carneiro Gonçalves (Contos e Lendas, em 1975). “As Mãos dos Pretos”, que deu nome a esta antologia, é também título de um dos textos selecionados para ilustrar a obra de Luís Bernardo Honwana. Nelson Saúte justifica a escolha deste texto com a seguinte frase: “talvez seja o mais belo conto que jamais se escreveu desde sempre na literatura moçambicana”. Nos anos 80 registou-se então uma verdadeira explosão de talentos, a maioria dos quais confirmaram-se mais tarde. À sombra do projecto “Charrua”, a literatura moçambicana foi conquistando nomes e enriquecendo com escritas emblemáticas. Ungulani Ba Ka Khosa com as suas estórias e Mia Couto, um dos mais conhecidos escritores moçambicanos da actualidade, são dois dos nomes que se destacam nesta época. Orlando Muhlanga, com o Diário de Sangue, um dos prosadores mais importantes do final do século XX revela-se já nos anos 90. “Com uma impressiva capacidade efabulatória, Muhlanga conta a guerra no seu interior, na dimensão fortíssima da sua crueldade”, relembra Nelson Saúte. A par de Ba Ka Khosa e Mia Couto, Aldino Muianga, Lília Momplé e Paulina Chiziane, entre outros, vêm colocar um ponto final na característica trágica que ensombrava a ficção moçambicana até então. Por último, a antologia intitulada “As Mãos dos Pretos” fica concluída com três textos do responsável pela apresentação deste manancial de ficção, Nelson Saúte.
http://singrandohorizontes.wordpress.com/2010/05/10/nelson-saute-as-maos-dos-pretos/