Quem são os ministros “africanos” do novo governo português?
07 de Julho de 2011, 11:51
O primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, juntou Assunção Cristas e Miguel Relvas no novo governo português. Além de pertencerem ao Executivo que tomou posse no passado dia 21 de Junho e de já antes fazerem parte da linha da frente dos seus partidos, os percursos dos dois são bastante diferentes, mas ambos têm em comum um país: Angola. Conheça a vida dos ministros “africanos” de Portugal.
A nova ministra da Agricultura não sonhou ser política, nem era esta a vida que imaginava até há pouco tempo. A mulher que é descrita pela revista Única, publicada no dia 2 de Julho, como sendo “perfeccionista, pragmática e certinha”, entrou para o mundo da política por mera casualidade. Assunção Cristas confessou em entrevista aquela publicação portuguesa que tinha planeado “doutorar-se, ser professora e ter uma carreira académica”.
Em 2007 realizou-se em Portugal um referendo sobre a despenalização do aborto e tudo começou a mudar. Assunção Cristas, formada (licenciatura e doutoramento) em Direito, participou activamente no debate público a favor do “não”. Perdeu essa luta, já que o “sim” viria a ganhar, mas entrou noutro campo de batalha, o da política.
Entrar para um partido? Sim, mas “à experiência”
Pouco tempo depois, Paulo Portas, líder do CDS-PP (a terceira força política portuguesa) convidou-a para entrar no partido. Assunção aceitou, mas com uma condição: a sua entrada na política seria “à experiência”, para ver como corria. Não correu mal. Em 2009 iniciou funções como deputada no Parlamento português.
Ainda antes do início da carreira política, a sua entrada num escritório de advogados deu-se "por acaso", confessa. Estava a falar com um professor que participara numa conferência na universidade onde dá aulas, em Lisboa, quando a conversa foi dar à Faculdade de Economia de Luanda. Assunção Cristas aproveitou o tema para dizer que era naquela cidade que tinha nascido. E foi assim que nasceu um convite para uma sociedade de advocacia que, na altura, pretendia entrar no mercado angolano. A dupla nacionalidade da agora ministra influenciou positivamente a sua carreira no Direito.
Em 2004, quando ainda estava no Ministério da Justiça, viajou até Angola. Desde criança (foi para Portugal com nove meses) que Assunção Cristas não voltava ao país onde nasceu. País onde o seu pai, décadas antes, se dedicou à agricultura e pecuária, sendo produtor de café e de gado.
Sobre o regresso a Angola, Assunção Cristas revelou à revista Única que “adorou”. “Senti-me em casa” foi a expressão utilizada, na entrevista que deu recentemente à Única, para descrever a sensação vivida. Trinta anos depois voltava à cidade de onde é originária e que está também na origem do seu nome. Os pais da professora, que também nasceram em África, a mãe em Angola (Kwanza Sul) e o pai em Moçambique (na Beira), basearam-se no antigo nome da capital angolana – São Paulo da Assunção de Luanda - para baptizar a filha.
Miguel Relvas, o braço-direito do PM português
A política e o primeiro-ministro (PM) português juntaram Assunção Cristas e Miguel Relvas no novo governo, mas o percurso profissional destes ministros é bastante diferente. Se a ministra da Agricultura não pensava em entrar na política há uns anos atrás, o mesmo não se pode dizer de Relvas.
O agora ministro dos Assuntos Parlamentares respira política há décadas e era apontado por diversos analistas como sendo “possível ministro” mesmo antes de o seu partido (PSD) ganhar as eleições. Qual o motivo de tal presunção? Miguel Relvas é considerado o “braço-direito” de Passos Coelho, de quem é amigo desde os tempos da juventude, tempos em que ambos já participavam nas lides partidárias.
Miguel Relvas percorreu na infância um caminho oposto ao de Cristas. A jurista nasceu em Luanda e aos nove meses foi viver para Portugal; Relvas nasceu em Lisboa, em Setembro de 1961, e antes de completar um ano de idade veio viver para Luanda, onde os seus pais estavam estabelecidos, e aqui começam as suas ligações a Angola que duram até hoje.
Em 1974, com a revolução portuguesa do “25 de Abril” e a consequente descolonização, Relvas regressa a Portugal. Tomar é a cidade que o acolhe e é lá que conclui o liceu. Ao contrário de Assunção Cristas, Relvas iniciou-se na vida política activa bastante cedo: em 1985, com apenas 23 anos, entrou para o Parlamento português como deputado, função que exerceu durante mais de duas décadas.
Já nos anos 2000 desempenhou funções governativas. No governo liderado pelo actual presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, foi nomeado secretário de Estado da Administração Local, cargo que ocupou até 2004. Depois, Relvas assumiu a função de secretário-geral do seu partido, a posição mais importante logo a seguir à de presidente.
A política está presente em quase todos os aspectos da sua vida e o curso que tirou é prova disso mesmo. Relvas terminou a sua licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais em 2007. E em 2010 voltou à secretaria-geral do PSD, onde acompanhou e promoveu a candidatura de Passos Coelho a primeiro-ministro.
Apesar de o percurso de Relvas ter sido feito predominantemente no mundo da política, a carreira profissional do novo ministro dos Assuntos Parlamentares português não se esgota aqui. Relvas tem experiência e conhecimentos no sector empresarial, tendo pertencido ao conselho de administração do Finertec, grupo económico da área das energias, que está disseminado por vários países africanos: Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné Equatorial, São Tomé e Príncipe e República do Congo.
O “candidato mais africano”
Não se sabe se a presença destes dois ministros e se o facto de Passos Coelho ter proferido durante a campanha eleitoral que era o “mais africano de todos os candidatos", por ser casado com a guineense Laura Ferreira, vão ter alguma influência nas relações de Portugal com Angola ou com os outros países africanos de língua portuguesa. Mas a importância destas ligações está presente nas ambições do novo Executivo.
No programa de governo português pode ler-se que um dos objectivos estratégicos é “redobrar a importância do relacionamento com os países de expressão portuguesa (...) que no quadro da CPLP se revela estratégica e economicamente relevante”.
As ligações de dois dos 11 ministros e do próprio primeiro-ministro ao continente africano existem, se significarão que o governo liderado por Passos Coelho vai colocar os países que falam português na linha da frente das relações externas de Portugal só o tempo o dirá.
Hugo Maduro
http://noticias.sapo.mz/vida/noticias/artigo/1166097.html