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MOÇAMBIQUE: PROJETO PRO-SAVANA: COOPERAÇÃO OU CAVALO-DE TROÍA?
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Respuesta  Mensaje 1 de 1 en el tema 
De: nhungue  (Mensaje original) Enviado: 27/12/2012 12:41
De: paulopedrosaafonso  (Mensaje original) Enviado: 10/07/2012 12:09
 

Projeto ProSavana: cooperação ou cavalo-de-Tróia? 

A ambiguidade da presença brasileira em África

 

Corredor de Nacala, Moçambique (Clique na imagem para ampliar)

Corredor de Nacala, Moçambique (Clique na imagem para ampliar)

Talvez ainda seja cedo para se tirar conclusões definitivas sobre o recém-lançado Fundo Nacala.

Oficialmente, trata-se de um fundo “voltado a investimentos no setor de agronegócios em Moçambique[1], inserido no contexto maior de “um acordo de cooperação técnica para captar recursos financeiros para o desenvolvimento da agroindústria no Corredor de Nacala, região ao Norte do país africano.[2] O acordo, além de Brasil e Moçambique, inclui também o Japão.

 

Oficialmente, “o fundo deve beneficiar 10 milhões de moçambicanos.” [2]

De acordo com o que se lê no convite para o evento que marcou o lançamento do fundo, o tal acordo de cooperação trilateral é conhecido por ProSavana-JBM. [3]

O lançamento do fundo é apenas uma etapa de um processo que já vinha sendo pensado e realizado antes.

Abril de 2011. Seminário internacional. (Clique na foto para ampliar)

Abril de 2011. Seminário internacional. (Clique na foto para ampliar)

Em Abril de 2011, o seminário internacional Agronegócio em Moçambique: Cooperação Internacional Brasil – Japão e Oportunidades de Investimento apresentou “aos participantes o Programa de Cooperação Triangular para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical de Moçambique (ProSavana JBM)[4] . No seminário, estavam presentes, entre outros, os Ministros Marco Farani, da Agência Brasileira de Cooperação – a USAID brasileira – e Wagner Rossi, ex-Ministro da Agricultura. Uma das palestras, intitulada A Internacionalização do Agronegócio Brasileiro, foi ministrada pela Senadora Kátia Abreu e pelo Presidente do Conselho Superior do Agronegócio (COSAG), braço da FIESP voltado para o agronegócio. Também falaram representantes do governo moçambicano, da JICA – a agência de cooperação japonesa -, do Banco Mundial, além de empresários brasileiros e japoneses (Mitsubishi Co). [5]

O projeto ProSavana é composto de várias etapas, como mostra a introdução do Resumo Executivo do ProSavana-TEC, produzido em junho de 2011 pela Agência Brasileira de Cooperação, em conjunto com a Embrapa, onde é detalhada a etapa de transferência de tecnologia entre o Brasil e Moçambique. [6]

As mesmas tarefas podem ser vistas num documento de apresentação do projeto, aparentemente oriundo do governo moçambicano: ainda que a terminologia não seja a mesma utilizada pelos brasileiros, a descrição delas corresponde à feita do lado brasileiro. E aqui, as tarefas não são apenas descritas, mas encadeadas num cronograma. [7]

Cronograma do ProSavana, como visto em Moçambique (clique no gráfico para ampliá-lo)

Cronograma do ProSavana, como visto em Moçambique (clique no gráfico para ampliá-lo)

Ainda de acordo com o documento do ProSavana-TEC, “A lógica desta estrutura reside no pressuposto de se tomar como alavanca para o desenvolvimento do setor agrícola e rural moçambicano, o intensivo emprego de tecnologias agrícolas prontas (primeiro projeto), imediatamente aplicáveis em uma zona modelo (segundo projeto), como forma de se construir fatos, informações e meios que validem a sustentabilidade técnica e política do Plano Diretor supramencionado.

Ora, é aqui que o círculo se fecha, e é aqui que entra a FGV.

O Plano Diretor é, de acordo com a Solicitação de Proposta Nº 14740/2011 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), uma ação orientada a fomentar “a implantação de arranjos produtivos agropecuários através de investimentos públicos e/ou privados, permitindo a geração e distribuição de riqueza, redução da pobreza, o incremento da segurança alimentar, e a compatibilização entre produção e conservação dos recursos naturais, impulsionando uma rota de desenvolvimento sustentável que poderá se expandir para outras zonas de savana tropical na África.[8]

Quem acabou por ficar com a responsabilidade de elaboração de tal Plano foi a Fundação Getúlio Vargas, como afirma Cesar Cunha Campos, diretor da FGV Projetos. [2]

Ora, se o fundo de investimentos, que está nas mãos da iniciativa privada (“A captação do recursos do fundo será toda da iniciativa privada[2]), é parte dos tais “investimentos públicos e/ou privados” descritos na Solicitação de Proposta acima mencionada; e é com eles que se permitirá “a geração e distribuição de riqueza, etc, etc”; conclui-se então que as etapas anteriores já teriam sido, senão completadas, pelo menos iniciadas, para concluir a favor da “sustentabilidade técnica” citada no projeto do ProSavana-TEC, e que a etapa que antecede a elaboração do Plano Diretor, a de Estudos Demonstrativos por meio de implantação de áreas-modelo de desenvolvimento de explorações agropecuárias ao nível de vilas [8] só pode se referir ao plantio de soja, milho e algodão feito pelos 40 agricultores que emigraram para Moçambique em setembro do ano passado. [9]

Portanto, iniciadas todas as etapas, só falta agora ouvir dos moçambicanos, governo e  sociedade civil, a comprovação de que o programa ProSavana de fato permitiu “a geração e distribuição de riqueza, a redução da pobreza, o incremento da segurança alimentar, e a compatibilização entre produção e conservação dos recursos minerais, impulsionando uma rota de desenvolvimento sustentável que poderá se expandir para outras zonas de savana tropical na África.[8]

Mas quando, aqui e ali, se ouve falar em etanol ou álcool combustível, não há como não lembrar do país africano de língua portuguesa a oeste de Moçambique, em que projetos de propostas semelhantes acabavam por revelar o favorecimento do etanol em detrimento da produção alimentar. [11]

Uma coisa é certa: o modelo agrícola que os moçambicanos estão importando é um modelo de ponta. Mas se, por um lado, não há indícios de que seja, sequer aqui no Brasil, um modelo distribuidor de renda – ainda que gerador de riqueza – por outro lado, será uma excelente oportunidade para que a Embrapa-Monsanto [10] e outras empresas inerentes a esse modelo (quase todas estrangeiras, no Brasil e em Moçambique), vão consolidando a sua posição nesse continente eternamente suposto por desbravar.

Se esse modelo “funciona” no Brasil – e há que se ter muita clareza a respeito dos critérios usados nessa afirmação e não esquecer que a vasta extensão territorial do Brasil “permite” até que outros modelos convivam com ele – não quer dizer que vá “funcionar” em Moçambique, por mais semelhanças geográficas que existam entre os dois países: uma coisa é fazer crescer plantas em vastos tratos de terra – sejam eles do cerrado brasileiro ou da savana africana. Outra coisa bem diferente é fazer crescer plantas em vastos tratos de terra localizados em cenários socioeconômicos tão distintos quanto os dos dois países (só para dar um exemplo, o Brasil possui apenas 15% de população rural[12], enquanto Moçambique tem 70% de população rural[13], dos quais 95% praticam agricultura de subsistência; estarão estes efetivamente sendo incluídos no modelo brasileiro importado, ou acabarão por migrar para as cidades, e em que condições?)

Mas isso, em última instncia, cabe aos moçambicanos julgar, se não for por mais nada, em nome do respeito à soberania que deve sempre estar presente em qualquer cooperação que se queira diferente das práticas históricas de hegemonia dos países desenvolvidos.

A integração latinoamericana, como arma principal na luta contra a dependência e pelo desenvolvimento, não pode ser vista como algo que interessa somente ao governo, aos empresários e à economia. Ela tem que ser entendida como uma grande empresa política e cultural, capaz de convocar à participação ativa todos os setores do povo.” (Ruy Mauro Marini, em “Desenvolvimento e Dependência“)

Poderíamos acrescentar que o dito do criador do conceito de subimperialismo pode ser aplicado não apenas à integração latinoamericana, mas a qualquer integração que lute contra a dependência e pelo desenvolvimento, como parece ser o caso da cooperação Brasil-África

NOTAS

[1] Fundo da FGV quer captar US$ 2 bi para investimentos em Moçambique, Valor Econômico, 04/07/2012

[2] Brasil e Japão criam fundo de investimento para produção de alimentos em Moçambique, Agência Brasil, 04/07/2012

[3] Fundo Nacala – Programa Preliminar, FGV / Projetos GV Agro (Aqui ou aqui)

[4] Seminário em São Paulo orienta sobre investimentos no agronegócio em Moçambique, Embrapa.

[5] Programa de Cooperação Triangular para o Desenvolvimento da Agricultura das Savanas Tropicais em Moçambique – ProSAVANA-JBM – Seminário Internacional – Agronegócio em Moçambique: Cooperação Internacional Brasil-Japão e Oportunidades de Investimento, Agência Brasileira de Cooperação, Ministério das Relações Exteriores. (Aqui ou aqui)

[6] Projeto de melhoria da capacidade de pesquisa e de transferência de tecnologia para o desenvolvimento da agricultura no corredor de Nacala em Moçambique – ProSavana-TEC (aqui ou aqui).

[7] ProSavana – Uma oportunidade para o desenvolvimento de agronegócios no Corredor de Nacala. Governo de Moçambique (?)(Site da Fundação Malonda ou aqui)

[8] Solicitação de Proposta Nº 14740/2011 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. (Aqui ou aqui)

[9] Moçambique oferece concessão de terras a agricultores brasileiros

[10] Embrapa e Monsanto, uma “arquitetura porosa e criativa”

[11] Crise Alimentar: Embrapa faz parceria para ajudar Angola e

Crise Alimentar: Grupo brasileiro Odebrecht inicia em 2010 produção de açúcar e etanol em Angola

[12] Censo 2010 – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

[13] Base de dados geográficos do “Corredor de Nacala”, Moçambique. Anais XV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto – SBSR, Curitiba, PR, Brasil, 30 de abril a 05 de maio de 2011, INPE. (Aqui ou aqui

 

 


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