Em Minha Consciência...
Desde os tempos da Ditadura mantive sempre uma certa isenção quanto à politica de então. Nunca quis interferir fosse no que fosse, de modo a que o meu emprego, a minha família e os meus amigos não sofressem quaisquer incómodos quer para as suas vidas quer para a amizade que sempre lhes dediquei quer fossem a favor da politica de então, quer fossem declaradamente inimigos dela.E nas nossas reuniões, nas nossas tertúlias, todos emitiam as suas opiniões, todos tinham a liberdade de se manifestar sem que houvesse receio de que as suas proferidas manifestações políticas, pudessem sair do lugar em que se realizavam, sem alaridos, sem criticas, praticando, sem bem sabermos, a verdadeira democracia. Lembro-me que era assim nas nossas reuniões da Direcção do Clube Ferroviário de Lourenço Marques, de que também fui Director, das nossas reuniões em Nampula nos Movimentos por um Mundo Melhor, nas nossas reuniões dos Cursillos de Cristandade, então sob a égide do então Arcebispo de Nampula, considerado pela politica de então como um dos Bispos da Igreja Católica mais reaccionários do tempo, das nossas conversas particulares com amigos já desaparecidos como o Dr Pedro Augusto Cortesão Casimiro, das nossas tertúlias com o também saudoso e já desaparecido Dr António Tavares Simões Capão, das nossas tertúlias no Café Continental em Lourenço Marques com o Zeca Afonso, Armando Magalhães de Morais, Dr Barbosa médico dos CFM e de outro brilhante e conceituado advogado da mesma cidade de que agora me não recorda o nome, todos mais ou menos contrários à Situação então vigente , observados de perto pelo Dr Almeida Santos que se sentava sempre no mesmo lugar no referido Café e rodeados por elementos da bem conhecida PIDE, sem que isso nos trouxesse os costumados medos, mas com a consciência tranquila, pois sabíamos do que falávamos e dos intuitos dos observadores. Na altura o jornal francês "LE MONDE" lido à socapa, pelo Armando Magalhães de Morais e sendo proibida a sua leitura no País, era conseguido através do Consulado Geral da França, cujo respectivo Cônsul era amigo do meu prezado e também saudoso amigo Armando Morais. Todas as noticias provenientes desse jornal no que respeitava à politica ultramarina e à politica nacional, eram discutidas, analisadas e mau grado nosso, o que seria para nós o futuro, que muitos de nós augurávamos de muito mau. E era assim, pelos anos idos de 1960, sem ainda bem sabermos o que pensar se as previsões fossem como as que então eram por nós previstas. Mas claro, em Minha Consciência e para falar a verdade, nunca pensávamos em sair da nossa terra, fosse qual fosse o seu destino. Enganá-mo-nos claro, pois o nosso destino estava como então se verificou: A "guerra" perdeu-se na Capital do Império, como acontece sempre aos países colonizadores. E mal seria se Em Minha Consciência o não declarasse aqui nesta crónica em que lembro os bons homens e mulheres que deram o seu coração a sua alma e que perderam a sua vida por amarem tanto. E lembro toda essa gente, esses amigos, todos os que por amor nos deixaram e se libertaram para todo o sempre.
José de Viseu