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General: caneja de infundice - Raridade Gastronómica da Ericeira - Quem se atreve??
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De: Bete (Mensaje original) |
Enviado: 18/08/2009 17:59 |
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Mais insólita e de origem desconhecida é a caneja d’infundice, modo de na Ericeira cozinhar um peixe parente do cação. Senão atente-se: inteiro ou cortado em postas largas e polvilhado de sal, põe-se o peixe durante oito dias numa saca de sarapinheira (enterrado ou num sítio escuro), ao fim dos quais se abre. Deixa-se apanhar ar durante um dia e coze-se. Acompanha com batatas também cozidas e não é para qualquer paladar.
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Caneja de Infundice da Ericeira Raridade Gastronómica da Ericeira Colaboração Portugal Real Estate
Nota: A caneja, também designada por "pata roxa" ou "pinta roxa", é um peixe com o qual se confecciona na Ericeira um petisco único no país e não aconselhável a palatos sensíveis, constituindo assim uma raridade gastronómica. A dimensão ideal da caneja ronda os 60 cm.
Tira-se a pele da caneja, corta-se em postas presas ou ligadas pelas barrigas ou ventrejas, lavando-se (de preferência com àgua do mar limpa), salpicando-se com um pouco de sal, embrulhando-se numa serapilheira (com trapos brancos entalados nos cortes das postas) e colocando-se a curtir em sitio escuro e fresco durante cerca de 8 a 15 dias (de preferência entre Outubro e Março). Coze-se em àgua com sal. É acompanhada com batata cozida com pele, cortada ao meio e temperada com azeite. Quando bem curtido, o peixe apresenta reflexos de madrepérola. O azeite torna-se branco em contacto com a caneja cozida e esta exala um acentuado travo amoniacal que provoca a oclusão das fossas nasais no céu da boca. Acompanha-se com vinho tinto, o qual, por pior qualidade que tenha, fica com um sabor adocicado como se se tratasse de um vinho adamado.
Será que o Zézim ja provou esse prato???? |
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De: ZÉMANEL |
Enviado: 18/08/2009 21:38 |
CANEJA D'INFUNDICE, UM PETISCO CONTRA O PRECONCEITO |
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O tubarão ou o seu parente cação são bicharocos que, à primeira vista, repugnam aos olhos, quanto mais ao paladar.
Não nos apressemos, porém, nem deixemos lugar para o preconceito onde só deve haver curiosidade e largueza de espírito, como deve ser o caso quando de comida se trata.
Em Portugal, no interior alentejano, faz-se uma sopa com cação fresco, farinha de trigo, azeite, vinagre, alho, um ramo de coentros ou de poejos e fatias de pão de trigo que deixará rendido o paladar mais exigente, sobretudo se identificado com os segredos da dieta mediterrnica.
Percebe-se que, numa região do interior, onde já foi difícil, por insuficiências de vias de comunicação, fazer chegar os peixes mais delicados, o talento culinário se tenha apropriado de um monstrinho marinho mais resistente à decomposição fazendo dele um petisco apaladado e muito apreciado.
Estranho é que numa conhecida praia do litoral português, muito rica em peixes e mariscos nobres, a Ericeira " localizada a uns 50 quilómetros de Lisboa ", um parente do cação, a caneja, que dele se distingue por ter as barbatanas peitorais mais pequenas e apresentar, quer no dorso quer nos lados, pintas escuras, seja altamente considerado pelos pescadores locais.
Com a agravante da caneja não ser consumida fresca, mas apenas depois de ser submetida a uma cura que dura uma semana, fazendo-a adquirir um aroma muito intenso e característico, a que os locais chamam "infundice", palavra que os dicionários registam como significando "barrela de urina, em que se põe de molho a roupa muito suja, para depois se lavar melhor".
De forma menos chocante, digamos que a caneja d'infundice liberta, antes da cozedura, um intenso cheiro a amoníaco.
Depois de apanhada, a caneja é amanhada e embrulha-se numa saca de serapilheira. Ao fim de três dias, tempera-se com um pouco de sal e volta-se a embrulhar durante mais quatro ou cinco dias, ao fim dos quais se junta mais um pouco de sal. Completada a semana de cura, que deve ser feita em local escuro ou mesmo enterrada, a caneja liberta o tal cheiro a amoníaco.
Depois, em água abundante, coze-se a caneja, que nesta operação perde o cheiro a "infundice". Serve-se com batatas cozidas, tudo temperado com azeite e vinagre. O resultado é um prato simples, em que o peixe tem um aspecto acinzentado e um cheiro levemente amoniacal, de sabor muito intenso e textura macia.
Curioso é que o azeite, que é dourado, fica com aspecto esbranquiçado e leitoso ao contacto com o peixe.
As gentes da Ericeira " onde este prato é considerado uma raridade e, por isso, só é preparado sob encomenda e em muito poucos lugares com porta aberta, daí que se deva reservar algum tempo para essa tarefa " sugerem que a caneja d'infundice seja acompanhada por um vinho tinto novo, muito encorpado e taninoso.
Cada garfada exige a companhia de um gole de tinto. Garantem que, mesmo um vinho de pouca qualidade, ganhará asas a acompanhar a caneja d'infundice. Esta será a opinião mais controversa de tudo o que se encontra ligado a este tão peculiar petisco. Um vinho de pouca qualidade nunca deve ter lugar à mesa de pessoas decentes.
Parece horrível a caneja d'infundice? Parece. Mas e a caça "faisandée"? E os queijos a que os bolores azuis dão odores e sabores saponáceos, como os apreciadíssimos "Roquefort" e "Stilton"? E também não há quem garanta, ante o delícadíssimo paladar e a untuosidade celestial do caviar de esturjão, que, tratando-se de ovas, preferem as de pescada? Como escreveu, com génio, o poeta português Fernando Pessoa, quando provou a Coca-Cola, "a princípio estranha-se, depois entranha-se".
Daí que não se deva desistir à primeira. A caneja d'infundice, mais do que um petisco com o seu quê de inusitado, pode ser encarada como uma lição contra o preconceito. Ou um hino à diferença. Aí está!
Há na Ericeira uma confraria da caneja d"infundice, que assumiu o encargo de preservar e divulgar este prato estranho e raro.
Texto: David Lopes Ramos | |
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