Histórias de amor
Foto de Amadorjp
Ela não gostava de histórias de amor. Romances de amor. Filmes de amor. Poemas de amor. Reencontros, finais felizes, em histórias de amor.
Achava o amor invenção de espíritos fracos, como a fé.
Fragilidade desnecessária. Fonte de dependências e complicações. Perca de individualidade.
Não era uma mulher fria ou frígida, apenas não acreditava e não gostava da palavra amor.
Satisfazia a vontade de sexo não criando afectos, compromissos.
Quando o conheceu estava já numa idade tranquila.
Tinha construído a vida, livre de presenças permanentes e de saudade.
Por ele, olhou para trás pela primeira vez na hora da despedida.
Pela primeira vez quis rever alguém.
Pela primeira vez desejou ficar depois de saciado o corpo.
Ela dizia-lhe:
-Nunca digas que me amas ou partirei. Nunca direi que te amo.
E a palavra amor era palavra proibida.
Sempre que sentia crescer nele a palavra. Sempre que sabia que ele a ia proferir, calava-o.
Selava a palavra na boca dele, com a sua.
E a palavra amor era silêncio.
Ele perguntava:
-Porque não queres que diga a palavra? Porque não a queres ouvir? Porque fazes da palavra vergonha e segredo?
Ela calava-se.
Calava a promessa feita numa cama de menina com ódio de mulher.
Calava como fechava os ouvidos para não ouvir a palavra. Calava como cerrava os lábios quando lhe pediam para a dizer.
A palavra amor, sinal de aceitação, rendição. A palavra amor, palavra que mataria a menina em si.
Ela dizia-lhe depois, quase em súplica:
-Nunca digas que me amas ou partirei. Nunca direi que te amo.
Um dia ele não apareceu. O silêncio do amor tornara-se fardo insuportável
Um sentimento novo e indesejado cresceu dentro dela.
Tentou ignorar o chamamento do corpo. Calar a vontade. Calar a saudade.
Quando não resistiu. Quando desistiu da luta e se rendeu, ligou-lhe.
Disse triste:
- Eu amo-te. E desligou.
Ele correu para ela. Esperara tanto tempo voz e palavra.
Abriu a porta da casa dela com a chave que era a sua. A chave que ela não dera antes a ninguém.
Escrita nas paredes do corredor, na sala, saindo para a rua pelos vidros e persianas.
Escrita a vermelho como que arrancada de dentro, rasgando, perfurando paredes.
Escrita por toda a casa estava a palavra “amo-te”.
Viu-a na cama. Nas mãos um papel dizia da despedida.
No papel, desenhado por mãos de criança, estava um homem sorridente dando a mão a uma menina de olhos molhados e de revolta.
O homem dizia amo-te e sorria.
A palavra fora riscada vezes sem conta até rasgar o papel.
By Encandescente in Eroticidades