Não sou muito adepta de filmes que apelam para o sentimento com recurso fácil a dramas humanos, e confesso alguma frieza ao deparar-me com despedidas ou reencontros finais de amantes que vivem felizes para sempre (ou até o filme acabar, porque depois todos sabem que vem o desamor, a saturação e as traições).
Por isso, não sei bem o que me levou a ir ver este filme, tendo em conta que a sinopse dizia tudo: uma jovem de 23 anos (Ann - Sarah Poley), mãe de duas filhas, com um marido desempregado (Don - Scott Speedman), e uma relação conflituosa com a mãe (Deborah Harry), descobre que tem apenas dois meses de vida e, sem dizer nada a ninguém, decide fazer uma lista de tudo o que tem ainda de fazer até lá. Dessa lista fazem parte elementos tão mundanos como cortar o cabelo e colocar unhas postiças. Mas também coisas que não deveriam ser transcendentais, mas que o são, como fazer com que alguém se apaixone por ela e dizer todos os dias “amo-te” às filhas.
Era quase certo que iria sair da sala de cinema lavada em lágrimas, mas insisti, como um teste à minha insensibilidade. Confesso umas lágrimas involuntárias, mas no total, este filme deixa-nos a pensar nas coisas boas que temos. Talvez porque as relativizamos em comparação com problemas maiores, ou talvez porque a perspectiva de deixarmos de as ter, de um momento para o outro, faz com que, logo após o filme, queiramos falar com todos os amigos, ir jantar com a família, beijar um desconhecido, pegar no carro e fazer aquela viagem que sempre adiamos para amanhã, plantar a tal árvore, escrever o tal livro, ter o tal filho.
Isabel Coixet, através de uma co-produção onde participa Pedro Almodóvar, dá-nos a oportunidade de reflectir sobre nós mesmos, através da história de Ann, uma Sarah Poley surpreendente e paradoxalmente contida e explosiva, forte e frágil, pragmática e emocional, enigmática e expressiva.
Neste filme é posta em causa a percepção instituída do amor. Aqui o amor esconde a verdade e trai, deixa de ter palavras e refugia-se em silêncios constrangedores na sala de visitas de uma prisão. Mas revela-se na incompreensível esperança de consertar tudo, de controlar ainda um pouco o inevitável desfecho, na procura de uma substituta em vida para ela em morte, na gravação de cassetes para um futuro onde ela já não estará.
Sim, comovi-me, mas no caminho para casa, que decidi fazer a pé, era um sorriso que levava comigo.