Pietá
Vejo-te ainda, Mãe, de olhar parado, Da pedra e da tristeza,
no teu canto, Comigo ao colo, morto e nu, gelado, Embrulhado nas
dobras do teu manto.
Sobre o golpe sem fundo do meu lado
Ia caindo o rio do teu pranto; E o meu corpo pasmava, amortalhado,
De um rio amargo que adoçava tanto.
Depois, a noite de uma
outra vida Veio descendo lenta, apetecida Pela terra-polar de
que me fiz;
Mas o teu pranto, pela noite além, Seiva do
mundo, ia caindo, Mãe, Na sepultura fria da raíz.
Miguel
Torga
IN: Diário I
|