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General: Perguntas à Língua portuguesa - Mia Couto
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De: misabelantunes1  (Mensaje original) Enviado: 28/04/2008 00:47

Perguntas à Língua portuguesa

por Mia Couto

  • Venho brincar aqui no Portugu챗s, a língua. N찾o aquela que outros embandeiram. Mas a língua nossa, essa que dá gosto a gente namorar e que nos faz a nós, mo챌ambicanos, ficarmos mais Mo챌ambique. Que outros pretendam cavalgar o assunto para fins de cadeira e poleiro pouco me acarreta.

    A língua que eu quero é essa que perde fun챌찾o e se torna carícia. O que me apronta é o simples gosto da palavra, o mesmo que a asa sente aquando o voo. Meu desejo é desalisar a linguagem, colocando nela as quantas dimens천es da Vida. E quantas s찾o? Se a Vida tem é idimens천es?

    Assim, embarco nesse gozo de ver como escrita e o mundo mutuamente se desobedecem. Meu anjo-da-guarda, felizmente, nunca me guardou.

    Uns nos acalentam: que nós estamos a sustentar maiores territórios da lusofonia. Nós estamos simplesmente ocupados a sermos. Outros nos acusam: nós estamos a desgastar a língua. Nos falta domínio, carecemos de técnica. Ora qual é a nossa eleg창ncia? Nenhuma, excepto a de irmos ajeitando o pé a um novo ch찾o. Ou estaremos convidando o ch찾o ao molde do pé? Quest천es que dariam para muita confer챗ncia, papelosas comunica챌천es. Mas nós, aqui na mais meridional esquina do Sul, estamos exercendo é a ci챗ncia de sobreviver. Nós estamos deitando molho sobre pouca farinha a ver se o milagre dos p찾es se repete na periferia do mundo, neste sulbúrbio.

    No enquanto, defendemos o direito de n찾o saber, o gosto de saborear ignor창ncias. Entretanto, vamos criando uma língua apta para o futuro, veloz como a palmeira, que dan챌a todas as brisas sem deslocar seu ch찾o. Língua artesanal, plástica, fugidia a gramáticas.

    Esta obra de reinven챌찾o n찾o é opera챌찾o exclusiva dos escritores e linguistas. Recriamos a língua na medida em que somos capazes de produzir um pensamento novo, um pensamento nosso. O idioma, afinal, o que é sen찾o o ovo das galinhas de ouro?

    Estamos, sim, amando o indomesticável, aderindo ao invisível, procurando os outros tempos deste tempo. Precisamos, sim, de senso incomum. Pois, das leis da língua, alguém sabe as certezas delas?

    Ponho as minhas irreticências. Veja-se, num sumário exemplo, perguntas que se podem colocar à língua:

    Se pode dizer de um careca que tenha couro cabeludo?
  • No caso de alguém dormir com homem de ra챌a branca é ent찾o que se aplica a express찾o: passar a noite em branco?
  • A diferen챌a entre um ás no volante ou um asno volante é apenas de ordem fonética?
  • O mato desconhecido é que é o anonimato?
  • O pequeno viaduto é um abreviaduto?
  • Como é que o mec창nico faz amor? Mecanicamente.
  • Quem vive numa encruzilhada é um encruzilhéu?
  • Se diz do brado de bicho que n찾o disp천e de vértebras: o invertebrado?
  • Tristeza do boi vem de ele n찾o se lembrar que bicho foi na última reencarna챌찾o. Pois se ele, em anterior vida, beneficiou de chifre o que está ocorrendo n찾o é uma reencorna챌찾o?
  • O elefante que nunca viu mar, sempre vivendo no rio: devia ter marfim ou riofim
  • Onde se esgotou a água se deve dizer: "aquabou"?
  • N찾o tendo sucedido em Maio mas em Mar챌o o que ele teve foi um desmaio ou um desmar챌o?
  • Quando a paisagem é de admirar constrói-se um admiradouro?
  • Mulher desdentada pode usar fio dental?
  • A cascavel a quem saiu a casca fica só uma vel?
  • As reservas de dinheiro s찾o sempre finas. Será daí que vem o nome: "finan챌as"?
  • Um tuf찾o pequeno: um tufinho?
  • O cavalo duplamente linchado é aquele que relincha?
  • Em águas doces alguém se pode salpicar?
  • Adulto pratica adultério. E um menor: será que pratica minoritério?
  • Um viciado no jogo de bilhar pode contrair bilharziose?
  • Um gordo, tipo barril, é um barrilgudo?
  • Borboleta que insiste em ser ninfa: é ela a tal ninfomaníaca?

    Brincadeiras, brincriações. E é coisa que não se termina. Lembro a camponesa da Zambézia. Eu falo português corta-mato, dizia. Sim, isso que ela fazia é, afinal, trabalho de todos nós. Colocámos essoutro português – o nosso português – na travessia dos matos, fizemos com que ele se descalçasse pelos atalhos da savana.

    Nesse caminho lhe fomos somando colorações. Devolvemos cores que dela haviam sido desbotadas – o racionalismo trabalha que nem lixívia. Urge ainda adicionar-lhe músicas e enfeites, somar-lhe o volume da superstição e a graça da dança. É urgente recuperar brilhos antigos.

    Devolver a estrela ao planeta dormente.

Enviado pelo nosso visitante, sr. Francisco António, a quem agradecemos.

Isabel



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Respuesta Eliminar Mensaje  Mensaje 2 de 3 en el tema 
De: mayra1950 Enviado: 28/04/2008 04:35
Isabel,
Adorei!!!!!
Beijinhos,
Mayra

Respuesta Eliminar Mensaje  Mensaje 3 de 3 en el tema 
De: mayra1950 Enviado: 28/04/2008 04:35
Isabel,
Adorei!!!!!
Beijinhos,
Mayra


 
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