Gota e inteligência
O Imperador do Santo Império Germânico, Carlos V, também Rei Carlos I de Espanha, foi um dos mais poderosos governantes de todos os tempos. Os seus 40 anos de reinado (1516-1556) ocorreram durante a transição da Idade Média para os tempos modernos. Governou territórios na Europa, África, Ásia mas também o Império Azteca do México e o reino Inca do Peru. Foi descrito como o governante de 1 ‘Império em que o sol nunca se punha’. Não obstante este poder, Carlos V, tinha que viver com as limitações das dores artríticas e precisava de cadeira especial para ser transportado, não conseguia escrever uma carta, em virtude da doença chamada de ‘gota’ de que sofria, e tinha as mãos esburacadas (ulceradas), conforme revelou em cartas escritas por outros a seu filho Philip e a sua filha Joana de Áustria.
‘Galen’ o cirurgião romano descreveu a doença como uma descarga de ‘gotas’ dos 4 humores do corpo em quantidades desbalanciadas. «Gota», (gutta’) na medicina medieval era um sinónimo de podagra. Significava o resultado da defluxão de humores, e o termo podagra era utilizado se o pé era afectado, chiragra se era o punho ou gonagra, se era o joelho. Do sec. IV AC até ao fim do dec. XVIII, pouco se sabe dessa doença, que afectava as juntas, a não ser que era predominante nos homens sexualmente maduros, como referiu Hipócrates, e que os excessos de gula e os sexuais predispunham aos seus ataques agudos. O imperador tinha de facto um apetite voraz, especialmente por carne e bebia grandes quantidades de cerveja e vinho e tinha uma caneca especial com 4 asas. No século XIX, achou-se que esta doença era sinónimo de inteligência, o que em certa medida é verdade, já que só os inteligentes conseguem ter a mesa farta, como Carlos V. Mas de facto foi Carlos V, em 1552, na sequência do aumento e frequência dos ataques de gota, junto com outros azares na sua governação, deu um claro sinal de inteligência, ao abdicar, nos seus filhos, sendo um deles Philip II, de Espanha, mais tarde rei de Portugal, decisão confirmada em 1556, tendo este seu filho ainda uma estátua na varanda do Convento de São Gonçalo.
Guerra e Andrade