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General: O VELHO CASAMENTO NGUNI
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De: isaantunes (Mensagem original) |
Enviado: 10/02/2010 14:21 |
E a tradição do "Lobolo" Ora, o presente texto pretende dar a conhecer o velho casamento dos Ngunis. Porém, para se falar do velho e tradicional casamento Nguni há que, em primeiro lugar, saber quem são os Ngunis,donde vieram, como e onde agora vivem. Segundo alguns missionários, entre os quais A. T. Bryant1, os Ngunis, ou Vangunes como também eram conhecidos pelos antigos colonizadores portugueses seriam oriundos da região setentrional dos Grandes Lagos. Era uma numerosa etnia que se dedicava à pastorícia, sobretudo à criação de gado bovino e, por isso, estavam em constante busca de boas pastagens. Foram emigrando para a zona do planalto ao sul do nosso continente, tendo-se estabelecido na África Austral há cerca de cinco séculos. Durante a sua lenta marcha migratória teriam incorporado muitas pessoas de outras etnias, sobretudo mulheres. Um dos grupos que atingiu a região do rio dos Elefantes deu origem aos honga-Nguni. Isto quer dizer que os actuais Changanes e muitos outros Thongas da região sul de Moçambique são Ngunis de origem. E agora, sem mais delongas, vamos ao tema deste trabalho. Como é que os velhos Ngunis se consorciavam? Como eram os costumes que possibilitavam e levavam ao matrimónio? Num texto breve que se foi buscar à colecção “Memórias” do extinto Instituto de Investigação Científica de Moçambique, escrito pelo etnólogo português que viveu muitos anos em Moçambique, A. Rita-Ferreira,intitulado, precisamente, Etno-História e Cultura Tradicional do Grupo Angune (Nguni) há um capítulo interessante sobre o antigo casamento Nguni que mostra que o lobolo já vem de longe, e que o processo matrimonial em regiões do interior continua semelhante em muitos aspectos mesmo nos dias de hoje. Recapitulemos o que diz Rita-Ferreia. O matrimónio representava um “rito de passagem” para os dois noivos, assim transferidos do grupo dos solteiros para o dos casados. Para a jovem tratava-se mesmo de uma dupla transição, já que deixava a sua própria célula familiar para ser integrada na do marido. Como em todas as fases de passagem, podiam-se nele distinguir duas espécies de ritos: os de separação e os de agregação. Graças a esta nova aliança os membros interessados dos dois clãs realizavam mútuos esforços de aproximação. As cerimónias tinham como objectivo desenvolver estáveis sentimentos de amizade. Mas bastante tempo deveria decorrer antes do clã do marido – nele incluídos os antepassados- deuses - aceitar a nova associada. Como a partida da noiva deixava o seu grupo diminuído, havia que compensá-lo por meio de reconhecido valor: o lobolo.
As formalidades iniciais ritualizavam esse antagonismo existente entre os dois grupos. A respectiva família acentuava que a noiva lhes era de tal modo querida que todos lamentavam a sua perda. Durante a cerimónia principal estes sentimentos eram expressos por meio de vituperações mútuas, de insultos. Após o banquete nupcial onde todos se alegravam e confraternizavam, a hostilidade dava-se por terminada e a troca de oferendas podia então iniciar-se.
Tradicionalmente, a união matrimonial era um assunto privado, regulado entre as duas famílias interessadas. Pouca atenção era dada às preferências pessoais do novo casal.
Para o casamento se considerar plenamente consumado era indispensável o cumprimento de duas condições: o pagamento do lobolo combinado e o nascimento de pelo menos um filho, prova cabal da capacidade geradora da esposa. As mulheres estéreis podiam ser repudiadas. A união passava por cinco fases distintas: a) relação informal entre os dois jovens; b) negociações entre os representantes das partes interessadas; c) noivado formal e publicamente anunciado, depois de celebrado o acordo sobre o montante do lobolo; d) entrega do lobolo, frequentemente exigindo prolongadas discussões sobre a qualidade das cabeças de gado; e) transferência da noiva, ao anoitecer, em procissão, depois de preparada ritualmente, de aspergida com a vesícula biliar de um bovino, de solicitada a protecção dos antepassados-deuses e, enfim, de incitada a manter o bom nome do seu clã entre gente estranha; f) ritos marcando a agregação da noiva no grupo familiar do marido.
O gado pago a título de lobolo não era considerado como plena propriedade da família donde saíra a noiva. Se esta, por esterilidade ou gestação incompleta, não revelasse capacidade reprodutora, ou ainda, se se comportasse de maneira inaceitável poderia ser exigida a sua restituição. Além desta forma normal de matrimónio, Rita-Ferreria no seu trabalho aponta para outras consideradas irregulares. Na fase ritual, por exemplo, de ukuganguisela, mais corrente entre os chefes, as primeiras diligências eram realizadas pelos pais da jovem, desejosos de reforçar laços com uma família de maior relevo. No ukubaleka a rapariga podia fugir para a povoação do homem com quem quisesse se casar. Enfim, ao homem era reconhecido o direito de tomar pela força,ukuthluva, na própria povoação do seu futuro sogro, a mulher que não quisesse cumprir as promessas que fi zera de com ele contrair matrimónio. Todavia, mesmo estas formas irregulares não dispensavam as negociações entre as famílias envolvidas.
Entre as pessoas do povo, os plebeus, a importância de cada esposa dependia da ordem cronológica do respectivo casamento. Já entre os chefes, essa esposa, quando fosse “esposa principal” deveria ser proveniente de determinada família aristocrática e ter o seu lobolo pago pelo povo, e era a única que ocupava a indlunkulu e dava nascimento ao herdeiro. Caso não houvesse filhos varões o direito consuetudinário previa que fosse complementada por meio de uma co-esposa. O herdeiro podia ser também proveniente da “casa da direita”, mas nunca da “casa da esquerda”.
Muito se poderia ainda falar sobre o velho matrimónio Nguni. Mas fiquemos agora por aqui, pois outras ocasiões virão para mergulharmos nesse passado tão presente. Texto de Calane da Silva http://mulher.sapo.mz/afectos-relacoes/o-velho-casamento-nguni-8413-3.html
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