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notcias: MOÇAMBIQUE-VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
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De: isaantunes (Mensaje original) |
Enviado: 26/10/2010 09:50 |
Mulheres não denunciam maridos violentos para se manterem no lar - afirma Graça Samo, directora executiva do Fórum Mulher A VIOLÊNCIA doméstica ainda constitui um dos fenómenos preocupantes no país, afectando sobretudo a mulher e a criança. Dados do Ministério do Interior, que lida com esta problemática, indicam que pelo menos 12 mil casos de violência doméstica foram registados no ano passado. Graça Samo, directora executiva do Fórum Mulher, considera que para inverter esta situação a instituição que dirige tem estado a trabalhar na disseminação de informação sobre os perigos da violência, usando como instrumento para esse trabalho a Lei sobre a violência contra a mulher, aprovada pelo Parlamento no ano passado. Graça Samo, em entrevista ao “Notícias”, disse que a disseminação da informação é importante, tendo em conta que a lei que foi aprovada é diferente da proposta submetida ao Parlamento pela sociedade civil. É que houve muitas alterações e bastante profundas, em função das discussões que aconteceram quando o Parlamento iniciou os debates. A nossa entrevistada não comunga a ideia segundo a qual há mulheres que gostam de ser violentadas, razão pela qual as mesmas não apresentam queixas, mesmo vivendo diariamente episódios de espancamento pelos seus parceiros. Para Samo, a dependência económica e a pressão social é que estão por detrás da atitude destas mulheres. “Nunca vi, pelo menos, uma única mulher que gosta de ser violentada. O que me parece é que aquelas que não denunciam os seus parceiros têm medo de ver terminados os seus casamentos e de serem rejeitadas pelos familiares, tanto do marido como delas próprias, porque a nossa sociedade ainda não valoriza uma mulher solteira ou divorciada”, explicou. Maputo, Segunda-Feira, 25 de Outubro de 2010Notícias Graça Samo garantiu que o Fórum Mulher tem estado a divulgar a lei e a mostrar à sociedade que um dos objectivos deste instrumento é sancionar quem pratica a violência, mas ao mesmo temp, reeducar este indivíduo agressor, através de penas como trabalhos comunitários. Nesta entrevista, Graça Samo fala dos malefícios da violência e deixa ficar as suas impressões sobre os contornos deste problema e o que as organizações da sociedade civil estão a fazer visando a divulgação da legislação pertinente. NOTÍCIAS (NOT) - Todos os dias acompanhamos a ocorrência de casos de violência doméstica contra a mulher e criança. O que é que o Fórum Mulher está a fazer desde que a lei entrou em vigor para estancar este mal? Graça Samo (GS) – Desde que a lei foi aprovada, ou melhor, mesmo antes da sua aprovação, nós já realizávamos acções de sensibilização para que as pessoas tomassem consciência sobre o problema da violência. A lei aparece como um instrumento para ajudar os cidadãos a terem consciência sobre a dimensão da violência e, sobretudo, para buscar mecanismos e formas concretas de lidar com a violência. Então, o que temos estado a fazer é continuar com a sensibilização. O primeiro objectivo que a lei traz é o educativo para que as pessoas saibam que a violência é um problema, traz consequências nefastas para as famílias e, para a sociedade, no seu todo. Então, é preciso que as pessoas procurem resolver os seus problemas sem recorrer à violência. O que temos feito realmente é disseminar a lei porque a que foi aprovada é diferente daquela que nós submetemos ao parlamento. Houve mudanças substanciais, em função das discussões que aconteceram quando o parlamento iniciou o debate e as alterações sofridas foram profundas. O primeiro passo que nós tomamos como fórum mulher foi fazer uma análise sobre as mudanças efectuadas. Sentimos que ainda há muito trabalho educativo para ser feito, de modo que as pessoas conheçam a lei e, sobretudo, sobre como aplicá-la. Um aspecto importante que nós colocamos na disseminação é que a partir do momento que a lei entra em vigor, a violência doméstica passa a ser considerada crime público, o que significa que qualquer cidadão tem o dever de denunciar a violência que vive ou que presencia de outra pessoa. Hoje em dia violência doméstica já não é um problema de esfera privada ou de cunho familiar, é um problema de estado e quem não denuncia fica cúmplice. Estamos a fazer trabalho a nível das províncias, sobretudo com os tribunais e procuradorias para poderem ter o domínio desta lei. Formar disseminadores da lei, incluindo o pessoal das esquadras da PRM. NOT - Como é disseminada esta lei, tendo em conta a linguagem jurídica que nós os cidadãos não conhecemos? GS – Uma particularidade que esta lei tem é a sua simplicidade. Ela é muito pequena e muito simplificada na própria forma como foi desenhada. Porque o espírito que norteou a sua elaboração e aprovação teve em conta que os principais utentes são mulheres, as maiores vítimas da violência. Então a nossa preocupação, mesmo no processo de elaboração foi de fazer um instrumento simples que todos pudessem utilizar e eventualmente, entendê-la com facilidade. Claro que depois existe o problema de como articular um artigo com o código penal, porque há remissões, uma vez que há certas penas que não estão plasmadas na lei, mas estão no código penal. Eventualmente, a preocupação maior das pessoas não será necessariamente de ver qual é a pena no caso de acontecer uma situação desta ou daquela natureza. As pessoas precisam de perceber quais são os tipos de violência, como é que se manifestam, em que situações devem denunciar e o que é que acontece para se chegar à conclusão de que esta violência está a sair do normal. É verdade que não há nenhuma violência que seja normal, mas a dimensão e a persistência é que nos leva a dizer que é uma família que vive de violência. Mas também conta a gravidade da violência. Há casos de uma bofetada, mas há casos de ferimentos até inchaços, aí o juiz vai saber que tipo de pena é que se deve aplicar contra o violador. (Arquivo) QUEREMOS HARMONIA NOS LARES Maputo, Segunda-Feira, 25 de Outubro de 2010Notícias Diz-se que esta lei vai trazer instabilidade nos lares e vai acabar com os casamentos. O que é que está por detrás desta preocupação? GS – A lei não vem para desestabilizar os lares de forma alguma. As pessoas que dizem isso, estão a afirmar que os lares são construídos para violência, mas acho que ninguém se junta com uma outra pessoa com o intuito de violentá-la. Pelo contrário, a pessoa casa-se para viver uma relação pacífica e tranquila. Então, nós procuramos a partir do instrumento da lei quais são as diferentes implicações que uma forma de resolver conflitos violentos pode levar. A própria lei remete o violador a um processo educativo, daí que a primeira pena desta lei traduz-se numa pena que nem o código penal tem, que é o trabalho a favor da comunidade. Nós sabemos que antigamente existiam tribunais comunitários que aplicavam este tipo de castigo a pessoas que cometiam alguns erros nas comunidades, sem terem que necessariamente ir à cadeia. O que nós sentimos é que esta pena não passa de uma pressão social, para que a pessoa se sinta mal perante a sociedade, porque normalmente quem passa mal com a violência são as próprias mulheres, que são obrigadas a mentirem que caíram na banheira, ou que saltou óleo da frigideira, ora que queimou o olho, quando na verdade o marido é que lhe queimou. O nosso projecto educativo em torno da lei é discutir estes aspectos. Felizmente, esta lei tem poucos artigos, são apenas 27 e sem muitas alíneas. Claro que ela encontra algumas complicações por causa de alguns dispositivos, como, por exemplo, o artigo que diz que a lei tem que ser aplicada tendo em conta a salvaguarda de família. Nós colocamos para o debate o que é salvaguarda da família, significa que as mulheres têm que continuar a sofrer, a serem espancadas, mas têm que estar ali porque senão os filhos vão ficar sem mãe? Só que se esquece que são estas crianças que vão crescer num meio violento que as vezes ficam com a educação meio prejudicada porque os pais não estão em condições de os assisti-las devidamente. Nos países onde a lei funciona, quando os pais não conseguem garantir bom ambiente dentro de casa os serviços sociais levam os filhos para poder educá-los de forma adequada. Então nós trazemos estas questões todas ao debate. NOT – O outro aspecto que também é colocado é a questão de que as mulheres temem denunciar os maridos porque economicamente dependem deles. Como vê esta questão? GS – Eu também iria perguntar o que é que acontece quando é preso um marido traficante, a mulher e os filhos ficam a morrer? Ela encontra formas de sobreviver. Nós não vamos manter aquele violador, aquele criminoso só porque tem que alimentar os filhos, ele tem que ir se reeducar e só mais tarde é que vai se reintegrar na família. Se esse pai não é exemplar, não respeita a família incluindo os filhos, então não é um bom pai, não salvaguarda os direitos das crianças e nem se quer a sua capacidade de provisão em termos de alimentos está garantida. Temos muitas mulheres com capacidades de manter seus lares sozinhas, mas a dependência social faz com que elas vivam debaixo da violência. A nossa sociedade não valoriza uma mulher solteira e nem se quer reconhece a capacidade dela de ser autónoma e poder para educar seus filhos. Nós não somos contra os lares de forma alguma, é importante que a família exista mas que seja uma família devidamente enquadrada e educada, que reconhece o papel da mulher e dos filhos. NOT - Diz-se muitas vezes que a Lei não respeita a nossa cultura, qual é essa cultura? GS – Eu também questiono que cultura é essa e está baseada em que valores? De violência? Isso não corresponde a verdade, porque os nossos avós e os nossos pais, durante o processo de educação em nenhum momento nos falaram da violência como uma forma de resolver os conflitos. Este é um desvio á norma, é um desvio social e de comportamento, seja homem ou mulher que pratica a violência é um desvio. A questão de lutar pelos direitos da mulher e de reconhecer que elas têm direito a uma vida condigna é um direito legítimo e elas lutam por adquirir esse direito, a partir das suas casas, só que a resposta que encontram é a violência porque não se aceita esta mudança. Mas estamos a ver o país a mudar muitas coisas, Moçambique de hoje não é o de antes da independência, nem o de depois da independência. Estamos a mudar em muitas coisas, importamos novas dinâmicas, desde carros, comida, roupa até modelos de educação. A globalização quer dizer isso, mas o que nos preocupa é o facto de esta globalização não atingir os direitos humanos e de cidadania. Para nós, a lei da violência é uma estratégia muito correcta para trazer a vivência de cidadania para homens e mulheres. NOT - que é que se pode dizer em relação à violência doméstica no país? GS – Os dados oficiais que nós utilizamos são do Ministério do Interior, entidade que lida com esta problemática. Também temos o Ministério da Mulher que tem o papel de coordenar a articulação. Nos dados do ano passado, o Ministério do Interior nos apresentou cerca de 12 mil casos, com a violência doméstica contra a mulher em destaque. As mulheres são as maiores vítimas de todos os tempos. Um dos fenómenos que estamos a registar agora é que a violência está a atingir contornos alarmantes com casos de mortes. Não há uma semana que passa sem que a gente veja num jornal casos de homicídio. Se formos ao Gabinete de Atendimento da Mulher, encontraremos muitos casos de abandono de crianças, que são registados como violência contra a mulher, porque é ela que se queixa. Há homens também que se queixam, do abandono pelas esposas e poucos que se vão queixar por terem sido violentados. Só que quando as mulheres violentam seus maridos é na tentativa de se defenderem da atitude do parceiro. Muitas vezes esta mulher usa objectos contundentes e quando esses objectos são manuseados no meio de raiva podem acabar com a vida do parceiro. Também temos casos de mulheres que estão na cadeia como resultado de terem morto os seus maridos, mas muitas vezes é em resposta a uma violência cíclica que talvez dura há 20 anos, uma vez que a mulher também atinge o seu limite. A nossa preocupação está nessas crianças que vivem debaixo da violência, porque amanhã elas se vão tornar violentas.
A MULHER NÃO É OPOSITORA DO HOMEM Maputo, Segunda-Feira, 25 de Outubro de 2010Notícias A dimensão que nós temos é de que a violência está a crescer, mas eu não diria isso, pelo que me parece, as pessoas estão a tomar consciência de que o assunto não deve ficar entre as quatro paredes, a violência está a sair do espaço familiar da privacidade, explicou, respondendo à questão sobre a contribuição da sociedade na solução do problema. NOT - Existe um receio de que as mulheres querem substituir o lugar dos homens? GS – Nem nos interessa termos mulheres a substituir o lugar dos homens, porque se isso acontecer significa que as mulheres passarão a ser violentas e não é isso o que é importante para nós, porque os homens que temos hoje na nossa sociedade não nos interessam, queremos homens transformados, capazes de respeitar as suas filhas e filhas do vizinho, no lugar de aliciá-las para violá-las, sexualmente. Queremos deixar claro que a mulher não é opositora do homem, ela apenas procura uma sociedade estável. NOT – Quais são os tipos de violência doméstica mais frequentes? GS – Ainda não fizemos uma pesquisa que nos possa dizer quais são os vários tipos de violência. Para podermos analisar nessa perspectiva é importante que as próprias pessoas que vão denunciar tivessem consciência de todas as formas de violência, mas realmente é mais fácil uma mulher ir à esquadra da Polícia dizer que o meu marido bateu-me, abandonou-me e não está a cuidar das crianças, do que uma mulher ir dizer que o meu marido me violou. Existe a violência sexual, mas não sabemos em que dimensão. NOT - orque é que muitas mulheres não denunciam os maridos violadores ou praticantes de violência? GS – É sobretudo por causa da pressão social. Não existe nenhuma mulher que gosta de ser violentada, eu ainda não encontrei uma única. A pressão social é que está por detrás desta atitude. É o próprio marido e a família que a ameaçam, incluindo os pais da mulher que considera denúncia como uma vergonha para a família. Há casos até que se diz que a violência é hereditária, não é verdade, está errado. A pobreza não vem de hoje, mas nem por isso aceitamos ser pobres, estamos todos a lutar contra ela. O analfabetismo é mesma coisa, há famílias com uma geração inteira que nunca foi à escola, desde o bisavô, avó e os pais, mas hoje aparecem os filhos a lutar contra ele. Então, o mesmo acontece com a violência, temos que acreditar que é possível um mundo sem ela. A violência doméstica será aquela praticada pelos membros da família ou dentro de um espaço no âmbito da lei. Por isso, a primeira responsabilidade é das pessoas que estão por volta daquele meio e eu não acredito que uma pessoa sofra tanta violência sem que ninguém se aperceba. O problema é que quando ela acontece e é uma coisa leve, não transcende, mas se eu tenho um vizinho que tem o hábito e a cultura de violentar a esposa não é possível que isso aconteça de forma sistemática e eu não me aperceber, o próprio barulho vai me despertar, a não ser que seja uma família que vive bastante isolada, mas mesmo assim, haverá sempre uma maneira através da qual a situação vai sair fora das quatro paredes. É que essa mulher que é vítima da violência um dia vai acabar explodindo. Há mulheres que realmente chegam ao hospital moribundas, mas nunca contam o que acontece em suas casas. Para esses casos, o responsável da saúde que a atende tem que mandá-la à medicina legal para se ter provas do que realmente aconteceu com ela, mas também é preciso mandar o caso para a polícia porque mesmo antes dos resultados da medicina legal, as evidências são claras de que se trata de um espancamento, porque muitas das vezes esta mulher leva marcas. NOT - Será que a polícia está preparada para identificar estes casos? GS - Não totalmente, por isso estamos a trabalhar na educação dos agentes da Lei e Ordem, mas é importante que a gente entenda que o polícia também é um dos perpetradores da violência dentro da sua casa. A violência doméstica não escolhe classe social, nem económica o que significa que até os nossos chefes de colarinho branco, camisa e gravata são fomentadores deste mal. Então está a imaginar aquele agente da polícia que tem que receber um caso de violência que envolve o seu chefe, mas essas são as dinâmicas com as quais a justiça terá que lidar. NOT - Mas também temos acompanhado casos de vítimas que lhes são entregues nos gabinetes de atendimento intimações para os maridos. Isso é viável? GS – Não pode ser a vítima a entregar a intimação ao marido. Isso está errado e o que nós temos estado a fazer é incluir os agentes da Lei e Ordem nos nossos seminários. O Ministério do Interior reconhece que existem essas situações e há um processo que poderá ser feito para mudar a dinâmica, dai que hoje as esquadras da polícia têm os Gabinetes de Atendimento à Mulher Vítima de Violência. Mas ainda há uma necessidade de se trabalhar na forma como é mexido o processo para que não haja a exposição da vítima. A outra coisa que acontece é a questão de que a vítima vai ao hospital e tem que contar o que lhe aconteceu e depois tem que passar pela esquadra da polícia para também contar, depois terá que voltar ao juiz. Então, cada vez que ela conta estes episódios é como se estivesse a reviver o seu problema. Para evitar isto, há um modelo de atendimento que está a ser discutido que é o atendimento integral de como é que se pode conceber um formulário completo no sentido de que o primeiro a atendê-la tivesse toda a informação que seria útil para todos os actores que precisam de usá-la. Mas isto é um processo que ainda vai levar o seu tempo, daí que quando uma lei acaba de ser aprovada dá-se seis meses para a criação de condições para a sua aplicação. Joana Macie http://www.jornalnoticias.co.mz/pls/notimz2/getxml/pt/contentx/1114979 |
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