Desvio do "Santa Maria"
"Precipitou a Guerra Colonial"
4 perguntas a Pedro Jorge Castro, Autor de "O inimigo nº 1 de Salazar".
Galvão é um representante do regime que, dum momento para o outro, muda de lado. Porquê?
A ruptura demora dez anos a consumar-se. A correspondência particular dele para Salazar e o seu perfil mostram que ambicionaria ser governador de Angola ou ministro das Colónias, mas deixa de progredir no regime quando se desentende com Duarte Pacheco. É demitido do cargo de presidente da Emissora Nacional e, nesta fase, escreve um diário crítico para com Salazar e o regime, mesmo que continue a enviar cartas ao Presidente do Conselho para reconquistar a confiança e atenção.
Foi uma espécie de marialvismo político ou uma tentativa de obter um protagonismo político como o de Humberto Delgado?
Não parece correcto enquadrá-lo no marialvismo político. Durante sete anos de prisão, apesar de vigiado, conseguiu intensificar a luta contra o regime, imprimiu panfletos na Penitenciária de Lisboa, combateu e denunciou promiscuidades de juízes com processos, planeou fugas e concretizou greves de fome em protesto. Sofre demasiado para que tudo se justifique na sede de protagonismo.
A sua liderança ultrapassou a de Soutomaior no desvio do navio?
Creio que ultrapassou a de Soutomaior e a de Pepe Velo - alegado líder do Directório Revolucionário Ibérico. Galvão foi astuto nos preparativos e conseguiu que o alvo do sequestro fosse o navio português. Cada um dos três deixou versões pouco coincidentes, mas os passageiros referem Galvão como líder. O facto de a maioria dos telegramas para a imprensa ser assinada por ele, reforçou nos media a liderança.
Até que ponto o assalto ao Santa Maria mudou o percurso da história nacional?
É algo irónico, mas o País uniu-se mais firme à volta do ditador. No estrangeiro, o regime ficou praticamente isolado, agitou as consciências democráticas das potências e chamou a atenção para o ditador septuagenário. Terá precipitado o início da Guerra Colonial, uma vez que os primeiros confrontos pretenderiam aproveitar a presença em Angola de vários jornalistas estrangeiros enviados para Luanda à espera de uma eventual chegada do paquete.
http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1762561