Domingos Mossela, da AIM, em Lisboa
Lisboa, 10 Fev (AIM) – A democracia moçambicana está a desenvolver-se com a “maior maturidade de todos os moçambicanos”.
Este ponto de vista é do antigo Presidente moçambicano, Joaquim Chissano, falando quarta-feira, num breve contacto com a AIM, em Lisboa, à margem da inauguração da nova sede da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e de um colóquio subordinado ao tema “CPLP – Uma Oportunidade Histórica”.
Joaquim Chissano esteve em Lisboa para participar nos dois eventos, na segunda e terça-feira, a convite do Secretariado Executivo da CPLP. A realização dos dois actos insere-se no âmbito da semana comemorativa dos 15 anos da instituição, criada em Julho de 1996.
A CPLP completou 15 anos em 2011. As novas instalações, que funcionam na zona baixa de Lisboa, foram oferecidas pelo Governo português.
“Penso que a democracia moçambicana está a desenvolver-se com a maior maturidade de todos nós moçambicanos. Por isso é que estamos a ser mais exigentes, pois conhecemos cada vez melhor os nossos direitos, as nossas liberdades e isso é bom para o desenvolvimento de Moçambique”, sublinhou o ex-Presidente que se retirou voluntariamente da actividade política.
A democracia multipartidária foi introduzida em Moçambique ao abrigo da Constituição de 1990, aprovada dois anos antes da assinatura do Acordo Geral de Paz (AGP) rubricado em Roma, Itália, entre o Governo moçambicano e a Renamo, na altura movimento rebelde.
“Continuamos a ser uma referência em matéria de democracia (no mundo), nós que saímos do nada hoje somos referência”, reafirmou.
“Cada vez que há um congresso, cada vez que há eleições, vemos o interesse que o mundo tem de aprender alguma coisa de nós, claro que nós também continuamos a aprender dos outros, mas o número dos que nos admiram aumenta, isso é bom”, referiu o antigo Presidente.
A AIM questionou a Joaquim Chissano se os actuais altos índices de pobreza não poderão vir a constituir ameaça ao processo democrático.
O ex-Presidente da República explicou que “vamos ter pobreza por algum tempo ainda, porque à medida que desenvolvemos também aparecem novas exigências, portanto é uma pobreza qualificada, mas já não é a mesma pobreza que tínhamos antes”.
“Hoje, nós vemos a população nas zonas rurais, não vou falar das cidades, a viver com uma qualidade de vida diferente”, disse.
Joaquim Chissano citou como exemplo a sua aldeia natal, Maleíce, na província meridional de Gaza, onde não havia energia eléctrica, mas que “hoje há electricidade, muita gente tem electricidade, tem telemóveis, tem televisores e água potável.
Segundo o ex-chefe do Estado, “são coisas que muita a gente não olha, falamos da pobreza no abstracto e quando a gente diz que a pobreza está a diminuir, dizem que não, não está a diminuir, mas quem olha muito bem sabe que ter água mais perto é uma maneira de diminuir a pobreza”.
Chissano também cita como exemplo os progressos no ensino. “Em Maleíce não havia escola secundária. “Hoje há uma grande escola secundária” e isso “é muito salutar”.
Realmente, para notar alguma é preciso visitar as zonas rurais. Por exemplo, “hoje, quem vai para Tete (no Centro/Noroeste do país) constata a presença de grandes investimentos de empresas mineiras. Também existem muitas outras actividades. Há quem diga que as grandes empresas não trazem nada, mas trazem um desenvolvimento idêntico ao da agricultura”, observou.
Apesar das melhorias, Chissano reconhece as preocupações relativamente a pobreza, sublinhando que, 'também se regista um aumento da população', pressionando os esforços das autoridades no seu combate.
Os últimos dados populacionais apontam que Moçambique conta neste momento com pouco mais de 23 milhões de habitantes. O censo de 2007 apurou 20.07 milhões de pessoas, segundo o INE (Instituto Nacional de Estatística).
De acordo com os cálculos das Nações Unidas referentes a 2010, apesar do cenário relativamente invejável ao nível da estabilidade política, Moçambique continua a ser, mesmo para os padrões africanos, um país onde impera a pobreza.
Segundo os mesmos cálculos, 46,8 por cento da população moçambicana enfrentava condições de vida que não atingem o mínimo considerado necessário para fugir à pobreza extrema.
Este número, definido pela ONU como o Índice de Pobreza Humana, colocava Moçambique no 127.º lugar em 135 países analisados. Atrás apenas estavam países como o Afeganistão, Serra Leoa ou Guiné. A contribuir para este lugar estavam resultados muito negativos em indicadores como acesso a água potável, que beneficia apenas 42 por cento dos moçambicanos.
“É verdade que a economia moçambicana tem conseguido registar nos últimos anos ritmos de crescimento elevados, muitas vezes acima de cinco por cento, graças aos novos investimentos estrangeiros. No entanto, sem petróleo, crescimentos ainda mais fortes que ajudariam a reduzir o enorme diferencial de riqueza existente não têm sido conseguidos”, referia a ONU.
Em 2010, o PIB per capita de Moçambique ainda era de 1.083 dólares (em paridade do poder de compra), um valor que era quase três vezes inferior a média do continente africano e quatro vezes menos ao registado na vizinha África do Sul.
(AIM)
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