Acaba de ser aprovado o mais infame Orçamento de Estado da história da democracia portuguesa.
É um OE ilegítimo, pois assenta numa fraude democrática: executa um programa de transformação (mais propriamente, destruição) económica e social que não foi sufragado nas urnas e que, se o fosse, seria derrotado por uma imensa maioria.
É um OE fantasioso, pois assenta em pressupostos de previsão macroeconómica totalmente desfasados da realidade (a realidade, sempre esse empecilho!), tal como é amplamente ilustrado pelo permanente desfasamento entre as previsões macroeconómicas do governo e a evolução do desemprego, do consumo, do investimento, do défice, da dívida.
É um OE profundamente injusto, pois repercute a austeridade em sede de IRS em 89% nos rendimentos do trabalho e em 11% nos rendimentos do capital. Profundamente injusto pois ataca com extrema insensibilidade os mais vulneráveis (os desempregados, os doentes, os reformados) no contexto da mais grave crise social e económica das últimas décadas. Profundamente injusto porque, em sede de IRS, procede a alterações regressivas na fiscalidade que fazem com que quem recebe menos pague relativamente mais. Profundamente injusto porque perpetua a falta de progressividade ao nível do IRC, penalizando as pequenas empresas que mais postos de trabalho criam (incluindo as de sectores como a restauração, adicionalmente penalizadas pelo IVA). Profundamente injusto porque trata como intocável o serviço da dívida pública, servindo apenas para dar mais algum tempo à prossecução do projecto neoliberal deste governo (cujo núcleo fundamental é a eliminação de direitos laborais, a redução dos salários directos e indirectos e a conclusão do processo de privatizações a preços de saldo) e para dar mais algum tempo à transferência da titularidade dessa mesma dívida pública, principalmente da banca centro-europeia para os Estados - leia-se, para os contribuintes de outros países -, de modo a que o incumprimento, inevitável mais cedo ou mais tarde, venha a recair, também ele, sobre os trabalhadores e classes populares e não sobre os detentores do capital. Profundamente injusto porque mal toca no autêntico saque que são as parcerias público-privadas, ao mesmo tempo que retira salários a quem trabalha, reformas e subsídios de desemprego a quem descontou, apoios a quem está doente.
E é um OE profundamente destrutivo, pois apenas conduzirá ao alastramento da pobreza, ao aprofundamento da desigualdade, ao aumento do desemprego, à generalização das falências de PMEs, à perda de potencial produtivo da economia, à degradação da qualidade e universalidade de serviços públicos em áreas tão fundamentais como a saúde e a educação, à emigração em massa de população qualificada, à captura - pelos grupos económicos de sempre - de mais sectores de rendas asseguradas, de modo a fazerem uma população cada vez mais empobrecida pagar cada vez mais pelo acesso a serviços básicos.
Este OE infame foi concebido por este governo e aprovado e aplaudido de pé pelas bancadas do PSD e do CDS.
A História julgá-los-á.