A Escola
Não
podemos negar que a escola não deu aos seus alunos todas as
possibilidades que lhes devia dar, desprezou os mal dotados, obrigou-os
a actos ou tarefas que lhes depuseram na alma as primeiras sementes do
despeito ou da revolta, lhes deu, pelo quase exclusivo cuidado que
votou ao saber, deixando na sombra o que é o mais importante — formação
do carácter e desenvolvimento da inteligência —, todas as condições
para virem a ser o que são agora; se não saíram da escola com amor à
escola, a culpa não é deles, mas da escola. Acresce ainda que, lançados
na vida, a escola nunca mais procurou atraí-los, nunca mais foi ao
encontro dos seus antigos alunos, para lhes aumentar a cultura, os
informar e esclarecer sobre novas orientações de espírito, para lhes
pedir a sua colaboração, o seu interesse na educação das gerações mais
moças. Houve um corte de relações, quando a sua manutenção poderia
ainda de algum modo apagar as más lembranças que os alunos levavam. Que
admira que sintamos agora à nossa volta paixão e rancor? Tivemo-los nas
nossas mãos e não fizemos por eles tudo quanto podíamos, mesmo com as
possibilidades económicas e pedagógicas de que nos cercara o meio; em
nós temos de reconhecer o principal defeito; por consequência, também
em nós a principal causa do ataque.
Agostinho da Silva, in 'Glossas'
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