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HISTORIA: Portugal em 1807, entre o mar e o rochedo
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De: vylma (Mensaje original) |
Enviado: 17/08/2009 14:00 |
Portugal em 1807, entre o mar e o rochedo
Pequeno reino situado à beira do Oceano Atlntico,
Portugal dos começos do século XIX sentia-se como um molusco aturdido
entre a violência do mar e a solidez do rochedo. Era uma "orelha de
terra" premida de um lado, do lado do mar, pelo Império Britnico,
senhor das águas do mundo de então, do outro, o do rochedo, pelo
Império Napoleônico, comandado pelo mais brilhante general da história
européia. Qual seria o seu destino?
Portugal devia desaparecer
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Embarque da Corte, 1807( tela de Nicolas Delerive)
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Qual caminho lhe restava a seguir para poder sobrevier
em meio àquela luta titnica que separava as duas maiores potências da
Europa? A Coroa bragantina, todavia, tinha um trunfo secreto, algo que
os outros reinos menores da época não tinham: a possibilidade de
retirar-se para o distante Brasil.
Decretado o Bloqueio
Continental por Napoleão em Berlim, em 21 de novembro de 1806 (visando
isolar e levar a Grã-Bretanha a bancarrota em resposta a vitória do
almirante Nelson na batalha de Trafalgar, em 21 de outubro de 1805),
aguardou o imperador a obediência dos demais estados europeus a que não
negociassem mais com Londres.
Portugal, entretanto, tinha
históricas ligações com a coroa inglesa, sendo que praticamente
naquelas alturas vivia na raia protetora das embarcações inglesas.(*)
Não
havia modo do Regente português, o príncipe D.João, aceitar a imposição
ordenada por Bonaparte sem que de imediato pusesse em perigo todas as
suas colônias do ultramar. Colocou-se frente a uma situação extrema: se
traísse os seus velhos aliados perdia o que lhe restava das possessões
espalhadas pelo mundo, se desobedecesse a Napoleão seria invadido.
Exatamente
isso, de por um fim às hesitações do Bragança, foi o que se tratou em
Fontainebleau, em 27 de outubro de 1807, por ocasião do acordo secreto
assinado entre franceses e espanhóis tendo em vista a posição de falso
neutralismo de D.João. Como deveria ocorrer a ocupação de Portugal?
Antes
de tudo a Espanha aceitaria tropas francesas, comandadas pelo Marechal
Murat, em trnsito para fronteira de Portugal. Encerrada em seguida a
invasão, o território ocupado seria dividido em três partes: o Reino da
Lusitnia Setentrional , compreendendo o Porto e seus arredores, seria
da rainha regente da Etrúria (como compensação pela entrega da Toscana
aos franceses); o Principado do Algarves (com o Alentejo) ficaria para
Manoel de Godoy, o Príncipe da Paz, ministro supremo do reino da
Espanha; por fim, as Províncias da Beira, Trás-os-Montes e Estremadura,
sob controle direto francês estaria à disposição de uma negociação
futura.
Davam-se assim os passos para por fim à independência
do reino lisboeta( sem que com tudo revertesse à situação de 1580,
começo da União Ibérica, quando Portugal foi incorporado ao reino de
Filipe II). Deste modo, numa só sentada, o reino autônomo que fora
restaurado pelos Bragança em 1640, desapareceu no mapa do Império
Napoleônico, subdividido em três minúsculas províncias.
(*) O
mais remoto acordo acertado entre a Inglaterra e Portugal remonta ao
Tratado de Londres de 16 de Junho de 1373, ocasião em que João de Gante
deu a mão de sua filha, Filipa de Lencastre, a D. João I - ato que
selou a aliança política. A influência de Filipa de Lencastre foi
notável, tanto no ponto de vista da sua descendência (a Ínclita
Geração) bem como pela sua intervenção no que diz respeito às relações
comerciais entre Portugal e Inglaterra, incentivando as importações de
bacalhau e vestuário de Inglaterra e a exportação de cortiça, sal,
vinho e azeite, a partir dos armazéns do Porto. Situação que foi mais
consolidada pelo Tratado de Windsor de 1386 acertando favores
comerciais e defesa conjunta.Esta relação adquiriu caráter definitivo
pela assinatura do Tratado de Methuen, de 1703, tão criticado, que
trocava produtos portugueses primários por material mecnico e têxtil
dos ingleses.
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De: vylma |
Enviado: 17/08/2009 14:00 |
Dependência Ibérica
Tanto que reinos decadentes, a Espanha e Portugal
mantinham enormes extensões no Novo Mundo, na África e na Ásia. As
conservavam quase que inteiras devido à proteção que as duas potências
emergentes do século XVIII-XIX, a Grã-Bretanha e a França, lhes davam.
O
eixo Londres-Lisboa contrapunha-se ao de Paris-Madri. Natural fosse que
quando ingleses e franceses crescentemente se rivalizavam pelo domínio
do império do mundo, metendo-se em guerras (desde o começo da Guerra
dos Sete Anos, em 1758, até a derrota de Napoleão em Waterloo, em
1815), arrastavam consigo os reinos ibéricos, forçando cada um deles a
alinhar-se a um dos lados.
Ainda que a Espanha de Carlos IV, por
razões ideológicas e de sangue (tinha parentesco com os Bourbon
franceses), tivesse reagido à execução de Luis XVI, em 1793, enviando
tropas juntamente com Portugal para assolar a jovem República Francesa
na região do Languedoc-Roussillon (na campanha do Rossilhão, de 1793-5,
desbaratada pelos generais republicanos que aplicaram derrota aos
luso-espanhóis), Madri logo se deu conta que não podia voltar-se contra
Paris, não importando o regime radical que de lá governasse, pois
justamente a França era a principal fiadora do seu império ultramarino,
permanentemente ameaçado pela cobiça britnica.
Fez então o
acordo franco-espanhol de 1795, o Tratado de Basiléia, assinado em 22
de julho daquele ano, que projetou o nome de Manoel de Godoy, o
plenipotenciário que representava o rei Carlos IV, e que logo ostentou
o título de Príncipe da Paz. Por ele, a Espanha voltava a pôr-se ao
abrigo de Paris, entregando em troca metade da ilha de São Domingos
(Haiti).
Portugal, apesar de ter acolhido tropas inglesas em seu
território, insistia retoricamente em manter-se neutro, tentando
equilibrar-se em meio aquela confusão. Situação que conseguiu prolongar
com estratagemas por mais doze anos com artifícios de toda ordem.(*)
(*)com
exceção da curta invasão sofrida desde o Alentejo, liderada por Manoel
de Godoy, no conhecido episódio chamado jocosamente de Guerra das
Laranjas, de 1801, e que veio assinalar o começo da longa Guerra
Peninsular, travada entre os reinos ibéricos, a Grã-Bretanha e a
França, que se estendeu até 1814. Portugal safou-se do pior assinando o
Tratado de Badajoz, de 6 de Junho de 1801.
O Brasil, por sua
vez, fechado para o mundo desde 1605, como grande parte das possessões
ultramarinas, passou a ser alvo do interesse britnico, ferindo o
monopólio luso, arrancando aqui e ali concessões da metrópole Lisboeta.
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De: vylma |
Enviado: 17/08/2009 14:01 |
Uma corte infeliz
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D.João e Carlota Joaquina, um casal infeliz (tela de Manuel Dias de Oliveira)
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A monarquia lisboeta, sabia-se, era uma corte infeliz. A
rainha-mãe, D.Maria I, uma carola, enlouquecera de tanto acreditar que
o seu pai, o rei D.José I, ao banir os jesuítas por injunção do Marquês
de Pombal, havia virado numa pira de carvão, ardendo para sempre no
inferno.
Em 1792 cedera de fato a autoridade ao seu filho D.João,
seu secundogênito, um príncipe de escasso humor, com tendência a
engordar, baixo e muito feio, que "dormia no teatro e deliciava-se na
igreja".
Para o cúmulo da desdita ele casara com D.Carlota
Joaquina, infanta espanhola de gênio temperamental, uma quase anã sem
atrativo de beleza, manca e belicosa, "com os impulsos do sexo alvoroçados", que, entre outras coisas, conspirava contra o poder do próprio marido.
Situação
que fez com que ambos vivessem separados, ela no Palácio de Queluz, o
marido no Palácio-convento de Mafra (apesar disso, o casal teve uma
ninhada de nove príncipes e princesas). Tudo isso envolto num cenário
de beatice resignada, de procissões, de jejuns e flagelações, de missas
em favor a quantidades infinitas de santos e santas, num um ar de
tristeza mórbida. A Coroa infeliz reinava sobre "uma infeliz nação",
distante do restante da Europa em usos e costumes, "que se julga
andarem os portugueses ter séculos atrás das demais nações" (Hipólito
da Costa – Correio Brasiliense, vol III, 146).
O jovem
regente era famoso por apavorar-se com trovoadas e com as "conspirações
jacobinas" que estavam a atentar contra ele, a maioria delas supostas
ou inventadas por Pina Manique (1733-1805), um intendente-geral da
polícia, feroz perseguidor de liberais e "pedreiros-livres" (maçons),
explorava a inclinação assustadiça do soberano com pavores mil,
fazendo-o acreditar estar Lisboa, quando não a própria Barraca Real, o
Palácio da Ajuda, apinhada de punhais de Bruto, de doidos ou de
revolucionários, prontos a abatê-lo em cada canto ou por detrás das
cortinas. (*)
(*) A paranóia de D.João, o pavor a ser atacado
das sombras, é que determinou uma curiosa reforma nas janelas do Rio de
Janeiro. Quando a corte por lá se fixou em 1808, temeroso que pudessem
embosca-lo de alguma delas, cobertas por rótulas de madeira, autorizou
ao intendente-geral da polícia, o ouvidor e desembargador Paulo
Fernandes Viana, que ordenasse que elas devessem ter vidraças para
desse modo expor e assim desestimular um possível regicida. (ver
Laurentino Gomes "1808", pág.230).
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De: vylma |
Enviado: 17/08/2009 14:02 |
Portugal em 1807, entre o mar e o rochedo (parte II)
Pequeno reino situado à beira do Oceano Atlntico,
Portugal dos começos do século XIX sentia-se como um molusco aturdido
entre a violência do mar e a solidez do rochedo. Era uma "orelha de
terra" premida de um lado, do lado do mar, pelo Império Britnico,
senhor das águas do mundo de então, do outro, o do rochedo, pelo
Império Napoleônico, comandado pelo mais brilhante general da história
européia. Qual seria o seu destino?
Transferir o trono de lugar
Todavia, mostrou-se suficiente hábil em conseguir
protelar ao máximo o momento em que Napoleão daria sumiço no seu reino,
conseguindo evacuar da capital em tempo curto a maior parte dos
integrantes da corte e da fidalguia lusitana, junto com as louças e a
prataria, quando chegou a hora derradeira.
O plano de levar o
trono para a outra beira longínqua do Atlntico Sul não era novo entre
os portugueses. Em ocasiões outras, monarcas premidos pelas
circunstncias infelizes, como foi o caso de d.João IV (1604-1656), na
época do padre Vieira, já haviam cogitado em transferir-se para os
trópicos, pelo menos como uma solução transitória no intuito de escapar
ao sufoco de algum invasor.
Na época do regente D.João, a mais
clara exposição de motivos para realizar a operação foi dada pelo
Marquês de Alorna num arrazoado escrito seis anos antes da retirada,
por ocasião da Guerra das Laranjas, em que dizia:
"A balança
na Europa está tão mudada que os cálculos de há dez anos saem todos
errados na era presente.Em todo caso o que é preciso é Vossa Alteza
Real continue a reinar, e que não suceda à sua coroa, o que sucedeu à
da Sardenha, à de Nápoles e o que entra no projeto das grandes
potências que sucede a todas as coroas de segunda ordem na Europa.
V
A .R. tem um grande império no Brasil, e o mesmo inimigo que o ataca
agora com tanta vantagem, talvez trema e mude de projeto, se V.A .R. o
ameaçar de que se dispõe a ir ser imperador naquele vasto território
adonte facilmente pode conquistar as colônias espanholas e aterrar em
pouco tempo as de todas as potências da Europa.
Portanto é
preciso que V. A .R. mande armar com toda a pressa todos os seus navios
de guerra, e todos os de transporte, que se acharem na Praça de Lisboa
– que meta neles a princesa, os seus filhos,e os seus tesouros, e que
ponha tudo isto pronto a partir sobre a Barra de Lisboa(...) (carta de 30 de maio de 1801, citada por Oliveira Lima- D.João VI e o Brasil)
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O general Junot entrando em Lisboa (27/12/07)
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Sabendo-o um indeciso crônico e medroso, não deixa de
ser significativo que a determinação dele, acatando o ponto de vista do
ministro D.Rodrigo de Souza Coutinho, dos Negócios da Marinha e do
Ultramar, em deixar Lisboa, foi a melhor solução encontrada. No seu
jornal Hipólito da Costa já recomendara "...se não tivesse o vasta
império do Brasil, deveria ir para for, ainda que fosse para as
Berlengas, ainda que se conservasse no mar sobre a vela, em suas
esquadras..."
O exército português, reduzido a uns 10 ou 12 mil
homens mal armados e pior adestrados, não era páreo para nenhuma das
divisões de Napoleão (independente do fato de observadores terem
apontado o estado lastimável dos regimentos franceses que chegaram à
capital). Por conseguinte, o príncipe que se sabia pouco talhado a ser
herói, não podia enfrentá-lo. D.João não tinha inclinação em se fazer
de Davi para abater o Golias napoleônico. Ficar e resistir era perder o
trono e a liberdade. Dele, da sua família e do reino inteiro.
Escafeder-se
pelo oceano com tudo o que pudesse carregar pareceu-lhe o mais sensato,
e de fato o foi. Pouco importa que chamassem isso de "fuga", ou de "ato
covarde", pois o que imperou foi o bom senso. Quando, por fim, as
vanguardas esfaimadas do exército o general Junot adentraram em Lisboa
em 30 de novembro de 1807, vindos de uma campanha rápida e sem
resistências, o comboio naval lusitano já inflara as velas. Levando
umas 15 mil pessoas expremidas a bordo de 35 embarcações, apoiado por
reforços ingleses da esquadra do almirante Sidney Smith, já fazia três
dias que se desferrara do cais de Belém. O preço desse amparo à corte
em retirada era a abertura dos portos do Brasil ao comércio britnico.
Somente
na manhã do dia 29 de novembro conseguiu os ventos necessários rumando
então para o alto mar, emproado em direção ao Brasil. Era o estado
português inteiro, fundado 664 antes por D.Afonso Henriques, que se
transladava para o exílio. Deixava atrás de si um povo pasmo e
indignado com aquele abandono do que chamaram de "rei fujão".
Da
barra do Tejo, qualquer francês com lunetas podia vislumbrar alguns
mastros ao longe se indo embora; impotentes, outros viram-nos de cima
dos morros da capital.
Calmon, Pedro – O Rei do Brasil – a vida de D.João VI. São Paulo: Editora Nacional, 1943.
Cheke, Marcus – Carlota Joaquina, a rainha intrigante.Rio de Janeiro:José Olympio Editora, 1949.
Costa, Hipólito José da – Correio Brasiliense ou armazém literário. São Paulo, Brasília:
Imprensa Oficial do Estado, Correio Braziliense, 31 vols., 2002.
Dias, Maria Odila Leite da Silva – Interiorização da Metrópole e outros estudos. Rio de Janeiro: Editora Alameda, 2005.
Faoro, Raimundo – Os Donos do Poder. Formação do Patronato Político Brasileiro. Porto Alegre: Editora Globo, 2 vols. 1979.
Fragoso,
João e Gouvêa, Maria de Fátima – Antigo Regime nos Trópicos: a dinmica
imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII). Rio de Janeiro: Editora
Civilização Brasileira, 2001.
Gomes, Laurentino – 1808: Como uma
rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram
Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil. São
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Lima, Oliveira – D.João VI e o Brasil. Rio de Janeiro: Topbooks, 2006.
Manchester, Alan K. - Preeminência inglesa no Brasil. São Paulo: Editora Brasiliense,. 1973.
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depoimento de um pintor austríaco no Rio de Janeiro. São Paulo:
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Schwarcz, Lilia Moritz – A longa viagem da Biblioteca dos Reis. São Paulo: Cia das Letras, 2002.
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(1808-1821) - São Paulo: Editora Nacional, 1978, 2ª edição.
Wilcken, Patrick – Império à deriva: a corte portuguesa no Rio de Janeiro 1808-1821. Lisboa:Livraria Civilização Editora. 2005.
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