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A síndrome de Brown-Séquard é um conjunto de sintomas que surgem a partir de uma hemissecção (secção do lado direito ou esquerdo) da medula espinhal (hemissecção medular).
Já que a medula espinhal é composta tanto por neurônios motores descendentes quanto por neurônios sensitivos ascendentes, que parcialmente cruzam para o outro lado da medula, uma simples lesão medular hemilateral resulta em um quadro clínico com ambos os lados do corpo afetado:
A síndrome ocorre na maioria das vezes com uma ruptura ou lesão da medula espinhal, ocorrendo também, com menor frequência, com tumores no canal vertebral.
Para a compreensão dos sintomas presentes na síndrome, é necessária a compreensão da anatomia e função dos tratos nervosos que passam através da medula espinhal.
[editar] Bases anatômicas
[editar] Tratos ascendentes
Os tratos ascendentes realizam as funções de sensibilidade protopática, sensibilidade epicrítica e sensibilidade proprioceptiva.
Nervos aferentes para a sensibilidade protopática (percepção grosseira de pressão, temperatura e dor) penetram na medula espinhal através das raízes nervosas dorsais e cruzam, ainda no mesmo seguimento, para o outro lado (contralateral). A partir de então eles formam o trato espinotalmico (composto pelo trato espinotalmico lateral (5a) e pelo trato espinotalmico anterior (5b)), que vai até o tálamo e depois liga-se com o córtex somatosensorial do cérebro.[1]
Nervos aferentes para a sensibilidade epicrítica (percepção fina de toque e vibração) e para a sensibilidade proprioceptiva (percepção da posição dos membros e articulações) sobem posteriormente pelo sistema coluna dorsal-lemnisco medial no funículo posterior (composto pelo fascículo grácil (3a) e fascículo cuneiforme (3b)) no mesmo lado (ipsilateral) da medula espinhal até o cérebro, cruzando para o outro lado somente no bulbo raquidiano.[1]
Nervos aferentes para a sensibilidade proprioceptiva (percepção da posição dos membros e articulações) e para a sensibilidade epicrítica (percepção fina de toque e vibração) fazem parte do trato espinocerebelar (composto pelo trato espinocerebelar anterior e trato espinocerebelar posterior). Ambos os tratos anterior e posterior, por fim, transmitem a informação para o cerebelo ipsilateralmente. O trato espinocerebelar anterior realiza um cruzamento duplo, enquanto o trato espinocerebelar posterior não cruza. O trato espinocerebelar anterior trata tanto do impulso proprioceptivo quando do exteroceptivo, ou seja, da percepção externa, a localização e qualidade de uma sensação tátil. O trato espinocerebelar posterior trata principalmente do impulso proprioceptivo.[1]
[editar] Tratos descendentes
Os tratos nervosos descendentes realizam as funções de motricidade (movimento fino e grosseiro) e do sistema nervoso autônomo.
Entre 70 e 90% das fibras nervosas das vias piramidais (responsáveis pela motricidade fina) se cruzam antes da medula espinhal no bulbo raquidiano e descem pelo funículo lateral como trato corticoespinhal lateral (1a). As fibras nervosas restantes descem ipsilateralmente pelo funículo anterior como trato corticoespinhal anterior (1b) e não se cruzam ou se cruzam somente na porção terminal.
Também descem ipsilateralmente as vias extrapiramidais (2a-d), responsáveis pelo movimento grosseiro, e as vias do sistema nervoso autônomo.[2]
[editar] Consequências de uma hemilesão
Uma hemissecção da medula espinhal causa danos em muitos tratos nervosos, tanto em tratos que a cruzam quanto em tratos que não a cruzam, tendo como consequência a ocorrência de déficits neurológicos em ambos os lados. A síndrome de Brown-Séquard é caracterizada então por uma lesão em cada um dos três sistemas neurais principais: no trato corticoespinhal, no fascículo grácil e fascículo cuneiforme do sistema coluna dorsal-lemnisco medial, no trato espinotalmico e no trato espinocerebelar. Os feixes do sistema nervoso autônomo também podem ser lesados.
[editar] Sintomas contralaterais
Os sintomas contralaterais são causados por lesões nos tratos que cruzam a medula espinhal. Os tratos que cruzam a medula espinhal são o trato espinotalmico e o trato espinocerebelar anterior. Como o trato espinocerebelar anterior realiza um cruzamento duplo, primeiro na medula espinhal e depois no mesencéfalo, os sintomas contralaterais são consequência exclusiva da lesão do trato espinotalmico.
A lesão do trato espinotalmico causa a perda da sensibilidade protopática do lado oposto do corpo: as sensações grosseiras de dor, temperatura e pressão são prejudicadas.
[editar] Sintomas ipsilaterais
Os sintomas ipsilaterais são causados por lesões nos tratos que não cruzam a medula espinhal (funículo posterior, trato espinocerebelar posterior, trato corticoespinhal e feixes simpáticos) ou que realizam um cruzamento duplo (como o trato espinocerebelar anterior, que cruza na medula espinhal e depois cruza novamente no mesencéfalo).
A partir do ponto da lesão para baixo, há um dano massivo ipsilateral na propriocepção (sensibilidade profunda) e na sensibilidade epicrítica (sensibilidade de vibração e toque fino).
Além disso há a presença de uma pequena zona anestésica ipsilateral à lesão e um pouco acima dela, que é causada pela destruição da região de entrada das raízes nervosas posteriores na altura da lesão.[3] No lado afetado pode ocorrer uma hiperestesia, na qual um leve toque pode ser sentido como doloroso (hiperalgesia).[3]
Devido à lesão dos tratos motores (tratos piramidais e tratos extrapiramidais) ocorre inferiormente e ipsilateralmente ao local da lesão uma paralisia espástica. No segmento afetado a paresia é, no entanto, hipotônica, já que nesta região os próprios neurônios motores e as raízes nervosas do mesmo segmento estão envolvidos na lesão.
Além disso ocorre, devido a uma lesão dos feixes simpáticos, que descem através do funículo lateral, uma dilatação dos vasos sanguíneos. Inicialmente a pele se torna vermelha e aquecida, depois ela se esfria e sofre cianose (fica azulada).[4] A lesão dos feixeis simpáticos também faz com que a produção de suor na área seja diminuída ou extinta (anidrose). Como os tratos do sistema nervoso autônomo (sistema nervoso simpático e parassimpático) descem em ambos os lados, normalmente uma síndrome de Brown-Séquard isolada não causa danos à bexiga urinária, reto ou potência sexual.
Uma lesão ao nível da junção cervicotorácica (C7/T1) ocasiona adicionalmente uma síndrome de Horner ipsilateral