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CONTOS: CAPALAÚTSE POR MANELITO SILVA
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De: misabelantunes1  (Mensaje original) Enviado: 26/11/2007 01:31
Capalaútse
O Reis da Chiúta, insistia: Sr. José Francisco, o senhor tem que ir. O senhor não vai ter problema nenhum, porque a picada leva-o à minha porta. Quando encontrar a tabuleta é virar à esquerda e depois só mais 10 quilómetros.
Tudo tinha ficado acordado no Café Dominó, em Tete.
Está bem, vou. Disse o meu av척.
No dia aprazado todos acordaram cedo lá em casa, mas por ironia a partida foi tardia. Todos encontraram a sua justificação: A avó porque teve de ir à mercearia. O avô porque teve de aprontar a bagageira do Volkswagen. Nós, os netos, porque tivemos de ir à bomba da gasolina encher duas latas de combustível de reserva que o avô colocou sobre a bagageira.
Ainda me lembro do ensaio dos piscas, uns ap챗ndices que caiam dos lados.
Um trabalho que deveria ter sido feito de véspera foi adiado para a hora da partida. Na verdade a partida foi tardia, mas nada mais havia a fazer, porque as débeis justificações estavam encontradas. Só que este atraso, viria a traduzir-se num verdadeiro quebra cabeças como à frente se verá.
Capalaútse era uma localidade que se abastecia da cantina do Reis e ficava para os lados da serra que dava o seu nome à circunscrição da Chiúta na qual se inseria Capalaútse.
Era um sábado e lá fomos para Capalaútse.
A primeira etapa fazia-se entre Moatize e o Matundo, povoa챌찾o situada em frente de Tete, na margem esquerda do Zambeze.
Naquele tempo ir de Moatize ao Matundo era ter de percorrer cerca de 18 kms sob uma forte trepida챌찾o, pois a estrada era feita de paralelipípedos de pedra, mas dispostos de uma forma muito irregular.
Nas cartas, aquela estrada aparecia como estrada de primeira classe e na verdade era a principal via que ligava a Federação das Rodésias (hoje Zimbábwe e Zâmbia) à Niassalândia (hoje Malawi), onde circulavam muitos e enormes camiões transportando contentores de uns países para os outros. Aparentemente Moçambique era o sacrificado. Tanto assim, que tanto quanto me lembro Moçambique não se cansava de reclamar de tempos a tempos a comparticipação daquela federação nas obras de beneficiação da referida estrada que começava algures na fronteira em Changara e terminava por alturas de Blantyre junto da fronteira mas do lado da Niassalândia.
Uma vez chegados ao Matundo virávamos à direita e continuávamos ao longo do Zambeze para oeste e passámos a uma outra via, de terra batida, que nos conduzia ao desconhecido, pois para todos nós era a primeira vez que nos aventurávamos a viajar para aquelas paragens. Pelas características, aquela estrada era apenas um pouco melhor do que o tipo de estrada a que vulgarmente se chamava picada.
Manelito escreve aí os kms do carro para nosso controlo. Lá para a frente vamos fazer umas contas para avaliar quantos kms nos vai faltar percorrer até à casa do Reis em Capalaútse. Sim avô!
E lá fomos a passo de caracol. O velhote parecia receoso pelo Vokswagen, pois estava com pena de o ter levado a andar por caminhos t찾o estranhos.
Quando merecíamos estar a chegar a casa do Reis, eis que descobrimos pelos quilómetros percorridos que seguimos num percurso errado.
Quem conhece a província de Tete sabe bem que do Matundo se passa ao Mavúzi, depois pela base do monte Inhacapiriri, a seguir pela aldeia de Caunda, depois passa-se à Chiúta que fica junto da estrada que liga Tete a Cassacatiza (posto fronteiriço moçambicano na fronteira da província de Tete com a Zâmbia). A partir da Chiúta passava-se ao Sabondo, ao Bene e finalmente chega-se a Cassacatiza.
O erro foi que junto ao monte Inhacapiriri deixámos a estrada certa, paralela ao rio Zambeze, e movemo-nos para norte no sentido da Massamba, Cazula, Matenge, Furancungo, portanto a caminho do Planalto da Angónia.
Naqueles tempos n찾o havia telemóveis. Sabem disso, n찾o é? A linha telefónica estabelecida ao longo da picada, sabe Deus como, parecia estar exclusivamente destinada aos postos telefónicos das diversas administra챌천es espalhadas pelo sert찾o.
Mais tarde, viemos a saber pelo próprio que o nosso atrazo come챌ava a preocupar o Reis e que este come챌ava a mover-se de um lado para o outro, pensando que poderíamos ter passado além do cruzamento e que, viríamos a Capalaútse pelo lado oposto, como viria a acontecer.
O inimigo era somente o estado da picada. Na verdade, os nativos eram extraordinários, cumprimentavam-nos com uma vénia e destapavam-se à nossa passagem. Depois, lá se ficavam com a nossa ingratidão involuntária, agarrados aos olhos no meio de uma enorme nuvem de poeira e eu, assistia a tudo aquilo com muita pena.
Afinal, tudo parecia evoluir de uma forma absolutamente natural. O carro produzia poeira e a poeira fazia parar o ciclista. Afligía-mo-nos, mas n찾o havia remédio.
Naqueles primeiros anos da década de 60 nós, os portugueses, podiamos percorrer livremente a província de Tete de lés-a-lés. Ainda n찾o havia qualquer vestígio da guerra que a Frelimo iria desencadear mais tarde.
O verdadeiro inimigo do motorista eram as pontes de madeira; algumas em muito mau estado, os furos nos pneus, ou as avarias, e também os animais selvagens que muitas vezes chocavam com as viaturas.
O Reis residia na sua cantina em Capalaútse e era aí que nos devia esperar como combinado. Isto traduzia-se ter que sair da estrada principal Tete - Cassacatiza e entrar numa picada, bem mais picada, e andar 10 kms apontados ao rio Zambeze.
Para facilitar a identifica챌찾o do cruzamento prometeu pregar uma tabuleta numa árvore a apontar para Capalaútse.
De noite, por alturas da Massamba numa zona pedregosa e de mata cerrada, o meu av척 parou o carro junto a um jovem negro que se deslocava de bicicleta, sem luz, que parou e respondeu a medo. A Chiúta, fica muito longe patr찾o. N찾o é para aqui. Tem que voltar para trás.
Obrigado! Respondemos todos à uma. Estávamos ansiosos de saber qual o rumo que estávamos a levar.
Eu n찾o te disse Nazaré (minha avó), era lá atrás. E tu a dizeres-me que eu deveria seguir para a direita, quando eu deveria ter seguido em frente. N찾o posso acreditar!
Avó, estamos perdidos? Respondeu o meu av척: n찾o há que ter medo, temos gasolina e n찾o me venham dizer que t챗m medo dos coelhos e dos cabritos do mato.
Como vamos encontar nós a tabuleta do Reis pregada a uma árvore com estas luzes a razar o solo? Perguntava a minha avó. Respondeu o meu av척: Eu devia perguntar-te antes, porque viemos t찾o tarde para este mato desconhecido, quando afinal eu estava pronto a partir ao meio da manh찾.
Serralheiro mecânico da Camionagem Automóvel dos CFM, em Moatize, o meu avô materno tinha ido para África antes de eu ter nascido. Sempre o tomei carinhosamente como uma espécie de aventureiro. Era como o seu pai, o meu bisavô, que também andou nas campanhas de Mouzinho, no sul. E naquela noite estava a confirmar-me isso mesmo. Um aventureiro. Mas a viagem em si estava a tornar-se para nós crianças uma grande séca.
Depois da correc챌찾o, lá fomos para Capalaútse. Obviamente que n찾o est찾o a pensar numa rua com postes de electricidade iluminada de um lado e do outro.
Agora não me perguntem como, nem porquê. Lembro-me apenas de estarmos a percorrer o caminho em sentido contrário àquele que o Reis tinha descrito no Dominó como o acesso natural ao seu povoado. Quando vislumbrámos a luz do petromax do Reis, já tínhamos passado ao largo, bem longe, pela Chiúta e batido à porta de uma enorme palhota onde fomos atendidos não por um negro, mas por um branco (imagine-se, um branco lá nos confins do mundo!), que nos ensinou como voltar para trás e ir pela picada de regresso, ao encontro do Reis, que ele tão bem conhecia.
Agora pasmem: A umas escassas de centenas de metros da cantina do Reis, ainda na selva e numa extensa zona plana, fomos surpreendidos com centenas de coelhos e um ou outro antílope que ficavam moment창neamente parados, pela cegueira causada pela presen챌a dos faróis do carro. O meu av척 ficou t찾o feliz que parou e saltou imeditamente para o lado de espingarda em punho e aos tiros.
Imaginem quantos coelhos caíram!
No dia seguinte, domingo, que eu tanto desejava passar a brincar e a contemplar aquela extraordinária paisagem das serranias da Chiúta, tive que ficar com a av척 a ajudar a preparar o churrasco ao qual se associaram alguns nativos, amigos do Reis.
Uma recepção em beleza, e um domingo inesquecível, apesar daquela pequena contrariedade de ter que ajudar a avó. Céu azul, temperatura amena, ar puro. É assim a região da Chiúta, cujo nome vem da enorme serra que tapa as vistas do Zambeze que a partir da cantina do Reis (também construída sobre um monte) se poderia ter.
O regresso a Moatize foi bem melhor. O Reis veio connosco até ao cruzamento quase de propósito para mostrar a tabuleta com a inscri챌찾o Capalaútse, que na verdade tinha ficado bem visível, em lugar de destaque, numa árvore, mas que ninguém vira na ida.

Deixem-me agora que vos diga, com alguma tristeza, sublinhe-se:
(1) Cerca de 10 anos depois, na década de 70, voltei a Capalaútse na qualidade de militar, comandante de um grupo de combate.
(2) Não encontrei Capalaútse. Aquele local aparecia na carta militar com o nome de aldeamento de Zangaia.
(3) O Reis tinha abandonado a cantina, porque perdeu uma perna numa mina traiçoeira colocada na picada.
(4) A cantina tornou-se o refeitório do meu grupo. Pela sua localização bem exposta aos ataques do inimigo, um autêntico alvo em cima de um monte, optei por dormir na base do monte dentro de uma tenda.
(5) A planície dos coelhos atrás descrita tinha-se tornado numa pista militar para pequenos aviões que nos traziam os mantimentos.
(6) O aldeamento de Zangaia ladeava a pista.
(7) O nosso destacamento encontrava-se do lado oposto com a pista pelo meio.
(8) Aquela população mantinha uma excelente relação com os militares. No entanto nunca esquecerei que no primeiro dia, quando a coluna de viaturas nos transportava àquele local, fiz muita questão que o grupo de picadores fizesse o seu trabalho até dentro do aldeamento, quando me foi proposto que não valia a pena continuar a picar pois separáva-mo-nos apenas um rio quase seco, cujas areias eram permanentemente pisadas pelos animais domésticos e pela população, que só por si era motivo mais que suficientemente para se pensar que não havia mais minas a partir daquele ponto.
(9) Não aceitei e fiz questão que o grupo fosse rendido. O novo grupo avançou a picar em direcção ao aldeamento e uns passos à frente localizou uma mina anti-carro. Como era normal, procedemos imediatamente à sua neutralização, remoção e destruição. Na verdade, tratava-se de uma mina que tinha por baixo uma bomba das lançadas pelos nossos aviões e que não tinha explodido. Foi a primeira e única vez que tive um contacto directo com minas colocadas nas picadas. Aquela estava destinada a fazer um enorme estrago. Safei-me, graças a Deus. O seu rebentamento foi de uma tamanha violência que se ouviu na sede de um batalhão a umas dezenas de Kms dali. Mais uns motivos de simpatia e admiração colhi da parte dos meus pares, pela minha casmurrice. Daquela vez acertei. Apesar de tudo, Zangaia, como base das minhas operações, deu-me a oportunidade de desenvolver alguma perícia do ponto de vista militar na forma como conduzi o grupo e também a confiança que passei a sentir no cumprimento da minha missão. Ao percorrer as serranias que ladeavam o grande Zambeze, não me cansava de o apreciar. As águas que eu via naquela zona tinham acabado de passar nas pás das turbinas que produziam electricidade em Cahora Bassa. Serranias altas e verdejantes encostadas ao céu azul, ar puro e sol brilhante com temperatura amena. Inesquecível, de facto.
Manelito,
Macau, 25/11/07


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