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General: O dia em que fuzilaram o guarda-redes da minha equipa
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De: misabelantunes1  (Mensaje original) Enviado: 16/08/2008 00:27
O dia em que fuzilaram o guarda-redes da minha equipa

Nós éramos os do muro, sentadi챌os. Os outros corriam os futebóis, dispensavam suores. Enquanto nós, n찾o. As meninas passavam, com suas batas brancas, pareciam aprendizes de gar챌as. Os outros perseguiam-nas ca챌ando simpatias. Nós ficávamos no muro, olhos trincando as sombras femeameninas.Nosso futebol era ali, na mesa de matraquilhos do Bar Viriato. A mesa de jogo dormia fora do bar, ao dispor do luar que tombava no pátio. Era t찾o pesada que nenhum ladr찾o punha nela sua cobi챌a. Os roubadores daqueles tempos tinham dedos tremedrosos, eram gente de pequeno empreendimento.
Naquele pátio do Bairro Matacuane ficava o estádio do nosso encantamento. Era ali que vibravam as nossas multidões quando a pequena bola de madeira escorrecaía no buraco da baliza. Mas nós, sem idade e com as raças todas à mistura, só podíamos frequentar o imaginário relvado no intervalo dos outros. A mesa de matraquilhos era nossa só quase às vezes. No resto, pertencia aos tropas, soldados que abundavam por aqueles lados. O Viriato ficava na fronteira dos mundos, subúrbio dos subúrbios.
Sempre quando há quartéis, os bairros perdem seus nomes civis. E o nosso lugar era agora chamado de Zona do Quartel. Com o novo nome vieram as prostitutas e encheram os bares com suas grandes pernas cruzadas. Mesmo em nossos sonhos aquelas pernas se descruzavam sob len챌óis que transpiravam. Por isso, nossos pais já n찾o permitiam que muito parássemos pelos lados do Bar. Os receios deles careciam de fundamento. Nós só entrávamos no exterior. Lá dentro, apenas nossa curiosidade espreitava.
Mas a brincadeira dos matraquilhos custava cada vez mais pre챌o. A moeda roubávamos lá em casa descarteirando eu de meu pai e Nandito n찾o se sabe de onde. A moedinha abria o momento mágico. A gente metia na ranhura e a máquina expedia suas nove bolinhas, já t찾o gastas que coxeavam em cada volta de seus épicos percursos.
Foi quando se deram os casos chamados para estória. Primeiro acharam gra챌a: apareceu um dos bonequinhas pintado de preto. O avan챌ado do centro da minha equipa tinha mudado de ra챌a, da noite para a madrugada. Os soldados portugueses, quando chegaram, fizeram riso e alcunharam o novo matraquilho de Eusébio.
Depois, apareceram mais tr챗s avan챌ados, subitamente transcoloridos. Ainda encontraram piada, anedotaram. Distribuíram mais nomes: Coluna, Vicente, Matateu. Só o dono do bar é que ventilou amea챌as: se descubro o sacaria do pintor, ai de quem!
Um dia a mesa amanheceu com todos os jogadores de ra챌a negra. No Bar Viriato, bem luso de seu nome e propriedade, figuravam os matraquilhos mais africanos do mundo.
Eu e Nandito apresentámo-nos bem cedinho, madrugada recém-estreada. N찾o tocámos no jogo, ficámos espectadores. Olhávamos as gotinhas de cacimbo, rebrilhando nas botas dos bonequinhos.
Até que surgiram os tropas, barulhosos, donos. Chegaram-se aos matraquilhos e trocaram suas admira챌천es. Dessa vez, ninguém riu. Ao inverso, havia uma raiva partilhada que multicrescia. De repente, um dos soldados se deu de berrar salivando raivas. Os outros tentavam de acalmar-lhe as fúrias. Mas nada, o homem se atestara de ódios. Súbito, retirou do cinto uma pistola e em volta fechou-se o sil챗ncio, solene. Parecia cinema, o Nandito olhava de espanto cheio: aquilo já n찾o era Viriato, era o saloon. E aquele soldado acenando a pistola era o Clint Eastwood, o Rambo dos tempos. Quem sabe foi por causa desse estado de maravilha챌찾o que o Nandito n찾o ouviu gritarem quando o soldado louco apontou sobre o guarda-redes da minha equipa. O tiro soou e o pequeno boneco esvoou, salpicando estilha챌os, mais súbitos que o sangue.
Ainda hoje aquele tiro continua ressoando em minha vida, junto com esse outro grito que, por engano de um rel창mpago, me pareceu sair do bonequinha alvejado.
Mia Couto


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