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notcias: Romance do escritor Mia Couto aborda isolamento de Moçambique
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De: isaantunes  (Mensaje original) Enviado: 01/08/2009 22:15
Romance do escritor Mia Couto aborda isolamento de Moçambique

Lúcia Bettencourt*, Jornal do Brasil

RIO DE JANEIRO - Que ninguém se engane: a cidade encantada criada por Mia Couto é mesmo Jesusalém, e difere da cidade dourada dos sonhos das cruzadas, já que não é o berço de Cristo e sim o lugar onde ele poderá vir se descrucificar. Jesusalém é o título do romance de Mia Couto publicado em Portugal e Moçambique, e que no Brasil a Companhia das Letras optou por chamar de Antes de nascer o mundo – o autor ofereceu os dois títulos.

A quase parábola tem suas raízes na realidade moçambicana, vista e interpretada por Mia Couto. Suas andanças o fizeram perceber duas coisas que estão presentes em seu país e no romance: a maneira de lidar com um passado traumático, que leva as pessoas a obliterá-lo, e a impossibilidade de voltar a um isolamento total neste mundo cada vez mais globalizado e integrado. Mesmo quando se deseja o isolamento e o esquecimento, a história e a vida ressurgem e impedem que esse tipo de vida em negativa se perpetue.

Profundamente abalado pela morte da mulher, Dordalma, aquela que era 'um bocadinho mulata' – Silvestre Vitalício afasta-se da cidade e do mundo. Com os dois filhos – Mwanito e Ntunzi – mais o criado, o ex-militar Zacarias Kalash, faz-se transportar pelo cunhado Aproximado para o lugar mais remoto e inalcançável que conhece. Numa velha coutada de caça abandonada e em ruínas, funda o seu refúgio isento da companhia feminina (isso se não se levar em conta a jumenta Jezabela, 'tão humana que afogava os devaneios sexuais' de Vitalício). Impede, na sua 'terra prometida', as rezas, as canções, os sonhos e as lembranças. E, sob o pretexto de que o mundo acabou, leva uma vida de silêncios. A narrativa começa quando o filho mais novo, Mwanito, aos 11 anos, vê uma mulher e rompe no choro, emocionado.

Silvestre Vitalício decide que todos serão 'desbatizados'. Exceto o mais novo, o narrador do romance, que se mantêm Mwanito, diminutivo de rapaz, já que o pai considera que ele 'ainda está nascendo'. Este Mwanito, o 'afinador de silêncios', aprende a lição do pai: 'Vocês não podem sonhar nem lembrar. Porque eu próprio não sonho, nem lembro'. Para Vitalício e os seus o mundo acabou, e eles são os únicos sobreviventes. 'Um dia, Deus nos virá pedir desculpa', diz Vitalício ao grafar, por cima da tabuleta indicativa de Jesusalém, a frase: 'Seja bem-vindo, Senhor Deus'.

O deus de Vitalício vem comentado pelo poema de Sofia de Mello Brayner Andersen, que diz que não sabe se o que escuta é deus ou o silêncio. Em Jesusalém, deveria imperar o silêncio, mas outras vozes teimam em se fazer escutar. Pouco a pouco essa utopia doente vai se desmoronando, através da desobediência e dos acasos, que levam a serpente ao interior do paraíso arquitetado pela teimosia humana. Mais uma vez a mulher provoca o abandono do paraíso: o grupo regressa à cidade e, ali, as lembranças, os sonhos, os sinais do passado e o amor feminino passam a imperar. Somente Vitalício permanece obstinado em seu mutismo, incapaz de conseguir que a chaga aberta pela morte da mulher cicatrize. Sua culpa o atormenta, como atormenta todos os outros personagens mais velhos. Somente o silêncio de Mwanito se modifica: ele afina os silêncios alheios em sua própria história, numa narrativa que só pode ser corretamente interpretada quando todos perceberem que as verdades de cada um não excluem a dos outros e que, pelo contrário, cada versão da verdade ilumina um aspecto da realidade, dando-lhe mais relevo.

As muitas viagens que são encetadas pelos personagens servem de metáforas para as buscas de identidades próprias. Desde as excursões proibidas ao rio, de Ntuzi e Mwanito, ao vai-e-vem de Tio Aproximado, ao eterno distanciar-se de Vitalício, até a recusa em partir de Zacarias – todas essas viagens revelam-se incapazes de construir um sentido para suas existências.

No entanto, a marginalidade em que vivem só consegue se manter marginal porque existe um centro. Enquanto Vitalício se recusa a admitir isso, seus esforços se revelam vãos e ficam cada vez mais violentos e desmotivados. A viagem de Marta, no entanto, vem dar um termo de comparação à do patriarca. Também ferida em seu amor, ela procura entender e aceitar para curar-se.

Já houve quem lembrasse que o romance de Mia Couto tem semelhanças com o conto 'A terceira margem do rio', de Guimarães Rosa. O isolamento procurado pode ser o mesmo, porém as lições são diametralmente opostas. No entanto uma coisa aproxima as duas narrativas: a tensão entre o feminino e o masculino. No romance de Mia Couto um universo poético feminino, questionador e problematizador, dialoga com a narrativa de Mwanito, e seu mundo masculino e estéril. Adélia Prado, Hilda Hilst e Alejandra Pizarnick falam de amor e de deus, expressam-se no elevado registro poético enquanto, na trama, as mulheres são deliberadamente eliminadas, abandonadas, silenciadas, dessacralizadas. Nesta tensão ambígua entre epígrafes e texto, devem-se ler as mensagens mais profundas, as verdadeiras geradoras de sentido, sentido que se deve encontrar sempre no entrelugar da literatura.

* Escritora, autora de A secretária de Borges e Linha de sombra. ambos publicados pela Record.

18:09 - 31/07/2009



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