O sítio e a queda de Lisboa
Lisboa, no século XI, já fazia mais de quatrocentos anos
que era um sitio dos mouros quando o rei D.Afonso Henriques decidiu-se
por tomá-la. A ocasião lhe favoreceu em vista da chegada de mais uma
arremetida de cruzados, liderados por quatro condestáveis, vindos de
outras partes da Europa e que, como sempre ocorria, tinham
desembarcaram no o Porto.
Entretanto, segundo o testemunho de um
cavaleiro inglês, um tal de "R", em relato enviado ao seu amigo Osberto
Bawssey, que deixou uma viva narrativa dos fatos que conduziram à queda
de Al-Ushbuna, nada indicava uma predisposição inicial dos cristãos em
tomá-la de assalto. Segundo ele foi uma expedição de um bando de
cruzados para os lados de Almada, um areal situado na beira do Tejo,
para abastecer-se com uns peixes, e os incidentes que se seguiram, quem
precipitou o ataque final à cidade, posta a sitio desde o mês de julho.
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Vindos do lado norte, atravessando o rio num vão
apropriado, os cruzados – a coligação de ingleses, normandos,
flamengos, franceses e colonianos (da cidade alemã de Colônia),
comandados pelo condestável Saério de Archelle, em conjunto com os
combatentes portugueses de D.Afonso – avançaram sobre Lisboa na segunda
metade do mês de outubro de 1147. Para apavorar ainda mais os mouros,
mostraram-lhes de longe, antes de devolvê-las, as 80 cabeças
decapitadas dos muçulmanos mortos um pouco antes numa refrega.
Para
melhor efetivarem o assédio, os cristãos logo trataram de construir uma
torre de onde pudessem arremeter contra os cimos dos muros inimigos.
Como parece que os mouros haviam sido pegos de surpresa com o cerco,
estocando assim pouco alimento, redundou que a fome da população
assustada facilitou a rendição da cidade, acertada no dia 22 de outubro
de 1147, depois de três dias de embates violentos.
No
conciliábulo feito fora dos muros entre os chefes ocidentais (Fernão
Cativo em nome do rei luso e Hervey de Glanville o condestável dos
ingleses e normandos), com os representantes muçulmanos, ficou acertado
que, em troca da vida e da futura liberdade, os lisboetas mouros
entregariam todas as riquezas públicas e privadas aos conquistadores,
sem haver necessidade deles submeterem as residências à pilhagem.
Acordo
inútil, visto que quando a soldadesca cristã adentrou pelos portões de
Lisboa no dia 25 de outubro, deu-se a invasão das casas dos mouros,
tivessem eles ou não, entregado tudo. Mesmo assim, o clima de festa
cristã não foi empanado.
A entrada festiva em Lisboa
à frente da procissão de ocupação, pois, descreveu o
cavaleiro inglês, ia o arcebispo e os outros bispos com a bandeira da
Cruz do Senhor e a seguir entram os nossos chefes juntamente com o rei
e os que para este efeito tinham sido escolhidos:
Oh! Quanta
não foi a alegria de todos! Oh! Quanta não foi a honra especial que
todos sentiam! Oh! Quantas não foram as lágrimas que afluíam em
testemunho de alegria e de piedade, quando todos viram colocar no mais
alto da fortaleza o estandarte da Cruz salvífica em sinal de sujeição
da cidade, para louvor e glória de Deus e da santíssima Virgem Maria. O
arcebispo e os bispos com o clero e todos os outros, não sem lágrimas
de júbilo, cantavam o Te Deum laudamus com o Asperges me e orações de
devoção.
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Lagos, ponta-de-lança da conquista portuguesa do mar oceano.
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Os portugueses, todavia, tiveram que traçar armas com os
mouros por mais de um século depois da tomada de Lisboa, quando
finalmente, com a espada de D.Afonso III, conquistaram Loulé, Aljezur e
o porto de Faro, situado bem ao sul do país, no ano de 1249. Desde
então, com os soberanos proclamando-se rei de Portugal e do Algarves, o
território lusitano manteve a mesma dimensão. Lagos, por sua vez, porto
algarvio, tornou-se mais tarde, nos tempos do infante D.Henrique, na
plataforma da expansão náutica de Portugal.
Se havia algum
consolo aos muçulmanos derrotados e expulsos de Al-Ushbuna foi saber
que pouco menos de dois anos depois, nas distantes terras da Síria, o
principado cristão de Antioquia, até então em mãos do Conde de Edessa
Raimundo de Poitiers, havia sido recuperado por Nur ed-Din, o atabeg de
Alepo, vitorioso na batalha de Inab, travada no dia 29 de junho de
1149, encerrando assim com a Segunda Cruzada (1147-49). De certo modo,
nesta perpétua luta entre mouros e cristãos, a perda de grande parte de
Portugal pelo Islã foi compensada pela reconquista por eles da Síria.
Bibliografia
Barbosa, Pedro Gomes - CONQUISTA DE LISBOA, 1147 -A Cidade Reconquistada aos Mouros, Lisboa: Tribuna ("Batalhas de Portugal"), 2004.
Conquista de Lisboa aos Mouros em 1147. Carta de um Cruzado inglês que participou nos acontecimentos, apres. e notas de José da Felicidade Alves, Lisboa, Livros Horizonte («Cidade de Lisboa, 4»), 1989.
Conquista de Lisboa aos Mouros (1147) Osberno, trad. de José Augusto de Oliveira, pref. de Augusto Vieira da Silva, Lisboa, Cmara Municipal de Lisboa, 1935 (2.ª ed., 1936);
Henriques, António Castro - CONQUISTA DO ALGARVE, DE 1189 A 1249.
O Segundo Reino. Lisboa: Tribuna («Batalhas de Portugal»), 2003.
Herculano, Alexandre – História de Portugal. Lisboa: Aillaud & Bertrand, 8 volumes.1914.
Saraiva, José Hermano – História concisa de Portugal. Lisboa: Publicações Europa-América, 1978.