Soberania finlandesa
O reconhecimento da independência finlandesa pelo governo bolchevique foi a primeira expressão concreta da exigência de Lênin pelo direito das nações de se
autodeterminarem.
A desintegração da Rússia ofereceu aos finlandeses uma oportunidade histórica para obter independência, mas após a Revolução de Outubro, as posições do conservadores e dos social-democratas quanto ao assunto da soberania foram invertidas. A direita estava agora ávida por independência, uma vez que a soberania os auxiliaria em controlar a esquerda e em minimizar a influência da Rússia revolucionária. Os social-democratas haviam apoiado a independência desde a primavera boreal de 1917, mas agora não poderiam usá-la para o benefício político direto de seu partido e tinham que ajustar a dominncia da direita no país. Nacionalismo havia se tornado uma "religião cívica" entre os finlandeses até o final do século XIX, e durante 1917, soberania era uma das poucas questões políticas na qual a maior parte do povo finlandês concordava.[22]
O Senado, liderado por Pehr Evind Svinhufvud, propôs a declaração de independência da Finlndia, a qual o Parlamento adotou em 6 de dezembro de 1917.[23] Apesar dos social-democratas votarem contra a proposta de Svinhufvud, eles decidiram apresentar uma declaração de independência alternativa não contendo diferenças substanciais. Os socialistas temiam uma perda de apoio ainda maior (como nas eleições de outubro) entre o povo comum nacionalista e esperava ganhar uma maioria política no futuro. Eles enviaram duas delegações a Petrogrado em dezembro de 1917 a fim de conseguir de Lênin uma aprovação da independência finlandesa. Ambos grupos políticos, portanto, concordaram com a necessidade de soberania finlandesa, apesar da grande divergência na seleção de sua liderança.[24]
O estabelecimento da soberania não era um precedente conclusivo; para uma pequena nação como a Finlndia, o reconhecimento pela Rússia e as potências europeias era essencial. Três semanas após a declaração de independência, o gabinete de Svinhufvud concluiu que teria que negociar com Lênin pelo reconhecimento russo. Durante dezembro de 1917, os bolcheviques estavam sob pressão nas negociações de paz com a Alemanha em Brest-Litovsk. O bolchevismo russo estava em profunda crise com um exército desmoralizado e o destino da Revolução de Outubro em dúvida. Lênin calculou que os bolcheviques poderiam talvez manter partes centrais da Rússia sob controle, mas teriam que desistir de alguns territórios em sua periferia, incluindo a Finlndia na fronteira de menor importncia ao noroeste. Como resultado, Svinhufvud e sua delegação do senado obtiveram a concessão de soberania de Lênin em 31 de dezembro de 1917.[25]
Em retrospecto, os eventos de 1917 têm sido vistos simplesmente como precursores da Guerra Civil, uma escalada do conflito, começando com a Revolução de Fevereiro. Mas as facções políticas opostas fizeram várias tentativas próprias sem sucesso de criar uma nova ordem e impedir o colapso social em 1917.[26] Os eventos da greve geral em novembro aprofundaram a suspeita e desconfiança na Finlndia e finalmente colocaram a possibilidade de conciliação fora de alcance. Os conservadores e ativistas de direita viram os grupos de trabalhadores radicais ativos durante a greve como uma ameaça à segurança do antigo estamento e da direita política, então resolveram usar todos os meios necessários para se defenderem, incluindo força armada. Ao mesmo tempo, trabalhadores revolucionários e socialistas de esquerda agora consideravam remover o regime conservador a força, ao invés de permitir que as conquistas do movimento trabalhista fossem revertidas. O resultado deste endurecimento de posições foi tal que no final de 1917, homens e mulheres moderados e pacíficos, como tão frequentemente durante toda a história, foram forçados a ficar de lado enquanto homens com rifles davam um passo a frente para tomar o controle.[27]
A escalada final para a guerra começou no início de janeiro de 1918. As Guardas de Segurança dos Trabalhadores mais radicais, de Helsinque, Kotka e Turku, mudaram seus nomes para Guarda Vermelha e convenceram líderes dos social-democratas que oscilavam entre paz e guerra para apoiar a revolução. As Guardas dos Trabalhadores foram oficialmente renomeadas para Guarda Vermelha no final do mesmo mês, sob o comando de Ali Aaltonen, um antigo oficial do exército russo, que havia sido designado em dezembro. Ao mesmo tempo, o Senado de Svinhufvud e o Parlamento decidiram em 12 de janeiro de 1918 criar uma forte autoridade policial, uma iniciativa vista pelas Guardas de Segurança dos Trabalhadores como um passo adiante na legalização da Guarda Branca. Quando o Senado renomeou a Guarda Branca de Exército Branco Finlandês, a Guarda Vermelha se recusou a reconhecer o título. Em 15 de janeiro, Carl Gustaf Emil Mannerheim, um antigo oficial do exército russo como Aaltonen, foi apontado como comandante supremo da Guarda Branca. Ele situou seu quartel-general em Vaasa, enquanto Aaltonen situou o seu em Helsinque.[28]
A data oficial de início da Guerra Civil Finlandesa é um assunto para debate. As primeiras batalhas sérias foram travadas entre 17 e 20 de janeiro na Carélia, no sudeste da Finlndia, principalmente pelo controle da cidade de Viipuri e para vencer a corrida por armas. A Ordem Branca para lutar foi publicada em 25 de janeiro; a Ordem de Revolução Vermelha foi publicada em 26 de janeiro. No dia seguinte, a Guarda Branca atacou trens levando uma grande carga de armas vindas da Rússia, como prometido aos Vermelhos por Lênin. A mobilização da Guarda Vermelha em larga escala começou na madrugada de 27 de janeiro, seguida por um ato correspondente dos Brancos, com o desarmamento das guarnições russas em Ostrobothnia durante as primeiras horas de 28 de janeiro. Uma data simbólica para o começo da guerra poderia ser 26 de janeiro, quando um grupo de Vermelhos escalou a torre do Hall dos Trabalhadores de Helsinque e acenderam uma lanterna vermelha para marcar o início da segunda maior rebelião na história da Finlndia.[29]
[editar] Irmãos em armas
Linhas de frente e ofensivas iniciais da Guerra Civil no começo de fevereiro (áreas controladas pelos Vermelhos em vermelho, e pelos Brancos em azul).
No início da guerra, a linha de frente percorria o sul da Finlndia de leste a oeste, dividindo o país em Finlndia Branca e Finlndia Vermelha. A Guarda Vermelha controlava a área ao sul, incluindo quase todos os centros industriais e as maiores propriedades rurais e fazendas com números altos de arrendatários e rendeiros de terra; o Exército Branco controlava a área ao norte, a qual era predominantemente agrária com fazendas e rendeiros pequenos ou médios, e onde arrendatários eram poucos ou possuíam uma posição social melhor que no sul. Enclaves das forças opostas existiram em ambos os lados na linha de frente: dentro da área Branca estavam as cidades industriais de Varkaus, Kuopio, Oulu, Raahe, Kemi e Tornio; dentro da área Vermelha se encontravam Porvoo, Kirkkonummi e Uusikaupunki. A eliminação destas fortalezas era uma prioridade para ambos os exércitos durante fevereiro de 1918.
A Finlndia Vermelha, mais tarde renomeada de República Socialista dos Trabalhadores da Finlndia, era liderada pelo Conselho do Povo em Helsinque. Kullervo Manner era o presidente e outros membros incluíam Otto Ville Kuusinen e Yrjö Sirola.[30] A Rússia Bolchevique declarou seu apoio à Finlndia Vermelha, mas a visão dos Vermelhos de socialismo democrático para o país não era semelhante à ditadura do proletariado de Lênin.[31] Lênin tentou evitar a desintegração da Rússia, mas falhou, e muitos pequenos territórios ocidentais do antigo império declararam independência. A maioria dos social-democratas finlandeses apoiava a soberania finlandesa,[32] entretanto, a Guarda Vermelha dominava a política da Finlndia Vermelha com suas armas, e seus membros mais radicais e os bolcheviques finlandeses, apesar de poucos em número, obviamente favoreciam a anexação da Finlndia de volta à Rússia. Esta questão maior desapareceu devido a derrota da Finlndia Vermelha.[33] O senado finlandês (Senado de Vaasa) foi relocado para a cidade de Vaasa na costa oeste, a qual atuou como a capital da Finlndia Branca de 29 de janeiro a 3 de maio, e buscava apoio militar e político da Alemanha. Mannerheim concordou com a necessidade de armas alemãs, mas se opôs a qualquer ajuda de tropas alemãs na Finlndia. Os conservadores planejaram um sistema político monárquico, com um papel menor para o Parlamento. Uma parte dos conservadores sempre havia sido contra a democracia; outros haviam aprovado o parlamentarismo a princípio, mas após a crise de 1917 e a erupção da guerra haviam concluído que empossar as pessoas comuns não funcionaria. Moderados não-socialistas se opuseram a qualquer restrição do parlamentarismo e inicialmente resistiram à ajuda militar da Alemanha, mas o confronto prolongado mudou suas posições.[34] A Guerra Civil Finlandesa foi travada nas ferrovias, o meio vital para transportar tropas e suprimentos.[35] O primeiro objetivo da Guarda Vermelha era cortar as conexões férreas dos Brancos de leste a oeste, o que eles tentaram ao nordeste de Tampere, na Batalha de Vilppula. Eles também tentaram eliminar sem sucesso a cabeça de ponte ao sul do Rio Vuoksi em Antrea no Istmo careliano, uma ameaça às suas conexões férreas com a Rússia.
As principais ofensivas ao final de março. Os Brancos cercaram Tampere e atacaram as forças da Rússia Soviética e Vermelhas em Rautu, no Istmo de Carélia.
O número de tropas em cada lado variou de 50.000 a 90.000. Enquanto a Guarda Vermelha consistia de voluntários em sua maioria, o Exército Branco continha somente 11.000–15.000 voluntários, o restante sendo conscritos. Os principais motivos para se voluntariar eram fatores econômicos (salário, comida), idealismo e pressão de outros. A Guarda Vermelha também incluía 2.000 tropas femininas, a maioria jovens garotas, recrutadas de centros industriais do sul da Finlndia. Ambos os exércitos usaram soldados juvenis, geralmente entre 15 e 17 anos de idade, o exemplo mais famoso sendo Urho Kekkonen, que lutou pelo Exército Branco e mais tarde se tornou o Presidente da Finlndia que mais tempo ocupou o cargo. Trabalhadores urbanos e agrícolas constituíam a maior parte da Guarda Vermelha, ao passo que fazendeiros donos de terras e pessoas bem-educadas formaram o principal suporte do Exército Branco.[36]